O ruído como dano ambiental
O ruído e o Direito
Numa primeira abordagem, o dicionário de Língua Portuguesa define o ruído como “som inarmónico produzido por corpo que cai ou estala; estrondo, fragor “. Esta definição de ruído- apesar de não ser a mais completa, tenta dar a entender o ruído como um som indesejável, desagradável, que perturba física ou psicologicamente aquele que o percebe ou ouve. O ruído (som) varia na sua composição naquilo que se refere à frequência, intensidade e duração. A
questão que se levanta é: em que medida é que os “incómodos sonoros”,
mais frequentemente entendidos como poluição sonora afectam o ambiente, e
em que plano se situa a tutela jurídica em relação a situações de
conflito em que a poluição está em causa. Já é claramente aceite que a
poluição sonora contribui, nos casos em que se verifica, para uma
degradação da qualidade de vida da população,
sendo que se torna mais incómodo á noite – período normal de descanso
da maioria das pessoas. Posto isto, o Ruído, ou poluição sonora não pode
carecer de meios jurídicos que o regulem com vista a uma melhor
qualidade de vida. Efectivamente há uma preocupação do Direito com a poluição sonora. A
primeira aproximação sobre este tema consagrou-se por via da Lei
nº11/87, de 11 de Abril (Lei de Bases) e, do decreto-lei nº251/87
(Regulamento Geral do Ruído). Treze anos passados, o legislador
ordinário efectuou alterações ao diploma acima referido. Nesse sentido, o Decreto-lei nº292/2000 veio consolidar a aplicação do princípio da prevenção em matéria do ruído.
O Decreto-lei n.º 9/2007 de 17 Janeiro, referente ao Regime Legal de
Poluição Sonora (RLPS), tem como objectivo a prevenção do ruído e o
controlo da poluição sonora, tendo em vista a salvaguarda da saúde e o
bem-estar das populações. O
Decreto-lei n.º 9/2007, de 17 de Janeiro foi rectificado pela
Declaração de Rectificação n.º 18/2007, de 16 de Março, e alterado pelo
Decreto-lei n.º 278/2007, de 1 de Agosto. Apenas uma nota, como já afirmava
o Professor Gomes Canotilho os litígios relativos ao ruído têm sido
mais solucionados no ramo do direito administrativo, apesar de o Direito
do Ambiente, onde a problemática do ruído enquanto dano ambiental se
insere, ser
um ramo de direito transversal aos outros ramos p.ex: direito pena ou
direito civil. O Professor afirma que " a permanente extensão e
diversificação do direito administrativo adquire relevância
jurídico-civil, pois ele passou a regular em medida crescente(…) a
produção de ruídos, até agora positivado no Código Civil"
Fig1- Níveis de som em decibel
A preocupação ambiental
O ruído é uma das principais causas da degradação da qualidade do ambiente urbano. Os
transportes são os principais responsáveis, embora o ruído de
actividades industriais e comerciais possa assumir relevo em situações
pontuais. De acordo com vários estudos efectuados, é reconhecido que,
para um mesmo nível sonoro, a percentagem de pessoas incomodadas é mais
elevada relativamente ao tráfego aéreo, seguido do rodoviário e por
último o ferroviário.
O dano ambiental
O dano ambiental pode ser definido como o prejuízo trazido às pessoas, aos animais, às plantas e aos outros recursos naturais (água, ar e solo) e às coisas, que consiste numa ofensa ao direito do ambiente, traduzindo-se numa violação, em concreto, das normas de qualidade ambiental. Como acontece noutros ramos de Direito, os danos devem ser reparados, se se encontrarem preenchidos os requisitos legais para a reparação dos danos. Assim também acontece no Direito do Ambiente. DL 147/2008, de 29 de Julho (com a alteração introduzida pelo DL 245/2009, de 22 de Setembro), inscreveu no ordenamento jurídico português o regime de prevenção e reparação de danos ambientais. Fê-lo na sequência da directiva 35/2004/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de Abril.Na análise deste diploma. A Professora Carla Amado Gomes aponta duas situações de extrema importância.
A autora refere no seu artigo inserido nas Actas do Colóquio sobre a
Responsabilidade civil por dano ambiental que a configuração sistemática
feita pelo legislador ordinário não é a mais feliz. Refere a autora que
“ porém, ao inserir um Capítulo II dedicado à Responsabilidade Civil, introduziu um elemento de dúvida existencial no regime pois, não só fez crer que no Capítulo III se não trata, afinal, de utilizar o instituto da responsabilidade civil (ou, noutra perspectiva, se aplicaria este mas apenas a entidades públicas, o que geraria um outro pólo problemático, derivado da necessidade de articulação com o regime da Lei 67/2007, de 31 de Dezembro…), como trouxe para o diploma todo um conjunto de situações claramente excluídas do seu âmbito de aplicação, por desnecessidade e diferença. Por desnecessidade, uma vez que as hipóteses de dano pessoal e patrimonial estão cobertas pelas normas do Código Civil, nos artigos 483º e segs; por diferença, porque só o dano ecológico stricto sensu recomenda um regime especial de reparação ou compensação de lesões, em virtude da especificidade dos bens”. Quanto ao destino das indemnizações pecuniárias que resultem de acções de condenação a cessação da conduta lesiva e respectiva indemnização por danos propostas por autores populares: revertem para o Fundo de Intervenção Ambiental e ficam afectas a projectos de recuperação de bens ambientais7 (cfr. o artigo 6º/1/d) do DL 150/2008, de 30 de Julho).
O Ruído como dano ambiental
O artigo3º, als. a) e b) da lei 9/2007 faz a distinção entre actividade ruidosa permanente e temporária, sendo o critério de distinção o carácter perante ou não da actividade que produza ruído nocivo ou incomodativo. A protecção do ambiente da poluição sonora, chega até a ser punida criminalmente, o artigo 279º nº1 al.c)
refere que quem desrespeitando as leis ou obrigações impostas provocar
poluição sonora mediante utilização de aparelhos técnicos ou de
instalações, é punido com pena de prisão até três anos ou com pena de
multa até 600 dias
Mais
uma vez nos deparamos com uma preocupação real e efectiva do ruído
enquanto dano ambiental. O artigo 21º da Lei de Bases do Ambiente
no seu nº1 afirma que são causas de poluição do ambiente as actividades
que afectem negativamente a saúde, o bem-estar e as diferentes formas
de vida, já vimos que o ruído pode ter esse efeito nocivo ou
incomodativo. Assim o ruído está legalmente previsto como um dano
ambiental. Atente-se ao artigo 22º da Lei de Bases do Ambiente:
Artigo 22.º
Ruído
1 - A luta contra o ruído visa a salvaguarda da saúde e bem-estar das populações e faz-se através, designadamente:
a) Da normalização dos métodos de medida do ruído;
b) Do estabelecimento de níveis sonoros máximos, tendo em conta os avanços científicos e tecnológicos nesta matéria;
c) Da redução do nível sonoro na origem, através da fixação de normas de emissão aplicáveis às diferentes fontes;
d)
Dos incentivos à utilização de equipamentos cuja produção de ruídos
esteja contida dentro dos níveis máximos admitidos para cada caso;
e) Da obrigação de os fabricantes de máquinas e electrodomésticos
apresentarem informações detalhadas, homologadas, sobre o nível sonoro
dos mesmos nas instruções de uso e facilitarem a execução das inspecções
oficiais;
f) Da
introdução nas autorizações de construção de edifícios, utilização de
equipamento ou exercício de actividades da obrigatoriedade de adoptar
medidas preventivas para eliminação da propagação do ruído exterior e
interior, bem como das trepidações;
g) Da sensibilização da opinião pública para os problemas do ruído;
h) Da localização adequada no território das actividades causadoras de ruído.
O
artigo começa por referir que a luta contra o ruído visa a salvaguarda
da saúde e bem-estar das populações (nº1 art.22º LBA). Ora, a saúde é
um direito fundamental. “Os direitos
ou as posições jurídicas subjetivas das pessoas enquanto tais,
individual ou institucionalmente consideradas, assentes na Constituição,
seja na Constituição formal, seja na Constituição material” consagrado
no art.64º
da CRP. Podemos afirmar assim uma "conexão de direitos fundamentais", o
direito ao ambiente e o direito à saúde, sendo estes os dois o
fundamento para o controlo do ruído e dos danos que possa vir a causar.
Para era essa regulação/controlo o artigo refere o estabelecimento de níveis sonoros máximos. O seu regime encontra-se no Decreto-lei 146/2006 que que transpõe a Directiva n.º 2002/49/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de Junho, relativa à avaliação e gestão do ruído ambiente. Este decreto-lei estabelece no seu artigo 2º o âmbito de aplicação, refere ainda os indicadores de ruído e os métodos de avaliação- artigo 5º e Anexo I e artigo 6º e Anexos II e III respectivamente. Quanto á localização adequada no território das actividades causadoras de ruído o artigo 13º determina que os mapas estratégicos de ruído e os planos de acção aprovados são disponibilizados e divulgados junto do público. A cobertura legal é então evidente. mais uma vez se evidencia uma preocupação efectiva do ruído enquanto dano ambiental.
Ainda outro Acórdão do mesmo tribunal rejeitou o recurso interposto pelo Ministério Público por considerar que "no que respeita ao suposto incumprimento da alínea f) do artigo 5.° do Decreto Regional n.° 10/82/A, de 18 de Junho, não basta afirmar que, na zona envolvente da reserva, se atinge um determinado nível de ruído. É necessário, ainda, demonstrar que esse ruído perturba o equilíbrio natural existente ou perturba as condições de calma e silêncio da Reserva. Ora, esse demonstração não foi feita - ainda que superficialmente - pelo Ministério Público."
A crescente preocupação com os efeitos nocivos do ruído e consequente poluição sonora, têm sido alvo de efectiva preocupação quer a nível de legislação quer a nível de respostas dos tribunais, esta efectividade é ainda assegurada pelo facto dos cidadãos estarem cientes da necessidade da protecção do ambiente neste aspecto em particular.
BIBLIOGRAFIA
METELLO, Francisco Cabral, Lei do Ruído - Anotado e Comentado , paginas 26-58
MIRANDA, Jorge, Manual de Direito Constitucional - Tomo IV - Direitos Fundamentais
CANOTILHO, José Joaquim Gomes, Boletim da Faculdade de Direito vol.69 1993, Actos autorizativos jurídico-publicos - pagina 21
Joana Trindade nº20409
Turma - A subturma3
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