Atualmente o
ambiente se enquadra como uma das maiores preocupações na maioria dos países. A
degradação ambiental trás insegurança à humanidade no que toca ao futuro da
espécie humana com qualidade e dignidade, nos mostrando a importância da
preservação e conservação de um meio ambiente equilibrado.
O presente artigo tem como objetivo
apresentar o direito ao ambiente como um direito fundamental, demonstrando a
importância de considerá-lo como tal para que a sua proteção seja ampla e efetiva.
Inicialmente, será abordada a origem
da visão de ambiente como um fator determinante para a preservação da vida
humana, bem como a crise ambiental pela qual passa o mundo contemporâneo. Na
sequência, serão apresentadas as dimensões dos direitos fundamentais,
justificando a classificação do direito ao ambiente neste rol. Finalmente, será
tratada a possibilidade de aliar o direito ao desenvolvimento com o direito ao
ambiente, sem a necessidade de sacrificar um ou outro.
2 A CRISE AMBIENTAL NO MUNDO
Observando a posição do ser humano
em relação à natureza, podemos constatar que muitas vezes a encaramos como
superior às outras espécies que nela habitam, pois somos capazes de promover
sensíveis alterações no meio ambiente. Isso, consequentemente, aumenta a nossa
responsabilidade, uma vez que nossas ações em sua grande maioria causam
significativas mudanças no equilíbrio ecológico do planeta.
A
respeito do tema, o Professor da Faculdade de Direito da Universidade de São
Paulo, José Cretella Júnior, explana:
“(...) o aparecimento
do homem, no planeta, passou a incidir, aos poucos, no meio ambiente,
alterando-lhe o natural equilíbrio, quando o ser humano necessitou das coisas
da natureza, utilizando-as para a alimentação ou para abrigar-se das
intempéries."
(...)
“No início,
praticamente desprezível, a ação humana vai depois, aos poucos, afetando o
equilíbrio do meio circunvizinho e, nas últimas décadas, em razão do avanço
tecnológico e do aumento extraordinário da poluição mundial, constituiu-se em
ameaça flagrante ao próprio destino da humanidade, que sem a menor dúvida, se
extinguirá, a não ser que os governantes e toda a comunidade internacional, em
conjunto, detenham a ação predatória do homem, que se faz sentir por motivos
imediatistas traduzidos em omissões e atos positivos, destruidores da vida
terrestre, marinha, atmosférica e estratosférica. Guerras,vazamentos de usinas
nucleares e de petroleiros, fábricas de móveis,indústrias, escapamentos dos carros
e chaminés, descargas das fábricas destroem a fauna marítima, fluvial e
lacustre, as reservas florestais, o ar atmosférico, colocando terra, mar e ar,
em vias de colapso total. Resta, se ainda houver tempo e consenso geral, a ação
imediata de governantes e legisladores para deter a ação predatória do homem, à
beira da destruição”[1]
Percebe-se que o doutrinador, em sua
obra, alerta para as alterações negativas provocadas pelo ser humano, muito em
razão do avanço tecnológico e do aumento populacional, além das guerras e
desastres ambientais, que também impactam de maneira prejudicial no meio
ambiente, fatores estes que podem vir a ser a causa da extinção da própria
humanidade se não forem tomadas atitudes urgentes e efetivas em sentido
contrário.
Em razão da interferência humana, a
biosfera se encontra ameaçada. Os recursos naturais são utilizados de forma
predatória e a população gera resíduos sem controle. Dessa forma, o nível da
qualidade de vida do planeta diminuiu, afetando o equilíbrio entre sociedade,
recursos naturais disponíveis e resíduos depositados no ambiente.
Em razão do cenário mundial atual,
surgiram discussões em torno da temática ambiental, as quais ocupam posição de
destaque internacionalmente.
Os países que elaboraram seus textos
constitucionais a partir de 1970 passaram a inserir o meio ambiente no rol dos
direitos que deveriam possuir a tutela do Estado. Essa mudança decorreu
principalmente após a Conferência de Estocolmo, na Suécia, ocorrida em 1972.
Esse evento, de extrema importância, passou então a ser considerado como o
marco do movimento ecológico mundial.
Os países que inseriram a proteção
ao meio ambiente em sua Constituição foram, dentre eles, a Suíça, através de
Emenda à Constituição em 1957; a Bulgária, em 1971; o Panamá e o Chile, em
1972; a antiga Iugoslávia, em 1974; a Grécia, em 1975; a Cuba, em 1976; a antiga
União Soviética, em 1977; a China, em 1978; o Peru, em 1980 e a Argentina, em
1994.
No
entanto, as primeiras Constituições que correlacionaram o direito ao meio
ambiente ao direito à vida foram Portugal, em 1976,como se vê no artigo 66 da
Carta Magna, e a Espanha, em 1978, conforme o texto disposto no artigo 45 da
Lei Maior.[2]
A Constituição Portuguesa trata o
ambiente como um bem jurídico tutelável, onde se considera como direito
fundamental do homem o direito de proteção ao meio ambiente, tratando-o não
apenas como um direito, mas também impondo aos cidadãos o dever de defendê-lo,
demonstrando a importância dada ao tema.
Do mesmo modo, o texto constitucional
atribui ao Estado a responsabilidade de criar e manter organismos próprios que
assegurem a preservação e conservação dos recursos naturais, visando a geração
de políticas ecológicas.
No
Brasil, até a Constituição promulgada em 1988, não se falava em proteção ao
ambiente de forma global. Eram tratados apenas assuntos como a competência
legislativa da União e proteção ao patrimônio histórico e cultural. A mudança
mostrou a evolução na mentalidade do país em relação aos problemas decorrentes
da falta de proteção ao ambiente e as consequências que poderiam acarretar para
a sociedade.
No entanto, ainda hoje as
legislações ambientais ao redor do mundo não apresentam grandes soluções
efetivas devido à deficiência na organização política e ideológica dos Estados
de Direito, que acabam por priorizar a exploração do ambiente pelos seres
humanos com o propósito de atingir um maior desenvolvimento econômico,
princípio que também é garantido pelas Constituições através da livre
iniciativa, que muitas vezes é sobreposta ao ambiente. [3]
Destarte, observa-se que não é
suficiente a simples criação de legislações ambientais se a cada conflito de
interesses o meio ambiente for sobreposto por outro direito em prol do
argumento de desenvolvimento econômico.
Este tipo de medida é um grande
avanço sobre a questão ambiental, mas, por si só, não soluciona o problema. É
preciso criar mecanismos de proteção e fiscalização efetiva do cumprimento da
legislação, tratando-a com a máxima prioridade, sob pena de a crise ambiental
que enfrentamos no mundo todo se tornar irreversível, condenando severamente
diversas espécies de fauna e flora, inclusive a humanidade.
3 O MEIO AMBIENTE NA CONSTITUIÇÃO
BRASILEIRA
3.1 CONCEITO
DE MEIO AMBIENTE
A palavra ambiente, originada do
latim “ambiens, entis, isto é, o que
rodeia", tem entre seus significados o meio em que vivemos, de acordo com
Paulo Affonso Leme Machado.[4]
A expressão "meio
ambiente", utilizada com frequência no Brasil, gera controvérsia entre os
doutrinadores por ser inadequada, uma vez que se torna redundante se
considerarmos que "meio" e "ambiente" são palavras sinônimas.
É por este motivo que países como Portugal e Itália se utilizam apenas da
palavra "ambiente".[5]
Como a cada dia o ambiente passa a
ter mais espaço na mídia, em razão do aumento de problemas ambientais, o
conceito que muitas vezes se faz entender é de que o ambiente tem o mesmo
significado que natureza ou recursos naturais, o que acaba por retirar o peso
das decisões políticas e ideológicas por trás do tema. Em realidade, o conceito
jurídico de ambiente vai além.
No Brasil, a Lei nº 6938/81, que
versa sobre Política Nacional do Meio Ambiente, conceitua:
"Art 3º - Para os fins previstos nesta
Lei, entende-se por:
I - meio ambiente, o conjunto de condições,
leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que
permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas;
(...)"[6]
O entendimento do conceito de
ambiente extraído da legislação é amplo, podendo ser entendido como a natureza
em geral de forma integrativa, englobando a ideia de ecossistema e considerando
cada recurso ambiental como dependente um do outro,sendo indivisíveis.
O doutrinador Celso Antônio
Pacheco Fiorillo, afirma tratar-se de um conceito jurídico indeterminado,
colocado de maneira proposital pelo legislador com a clara intenção de criar um
espaço positivo de incidência da norma. Ou seja, se houvesse uma definição
precisa de meio ambiente, diversas situações, que normalmente seriam subsumidas
na órbita de seu conceito atual, poderiam deixar de sê-lo pela eventual criação
de um espaço negativo próprio de qualquer definição.[7]
O artigo 225 da Constituição
Brasileira exerce o papel de principal norteador do meio ambiente, devido a seu
complexo teor de direitos, mensurando como obrigação do Estado e da Sociedade a
garantia de preservação e cuidado do meio ambiente, uma vez que se trata de um
bem comum do povo.
É o que se depreende do artigo
abaixo transcrito:
"Art. 225. Todos
têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do
povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à
coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras
gerações.
I
- preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo
ecológico das espécies e ecossistemas;
II
- preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e
fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético;
III
- definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus
componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão
permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a
integridade dos atributos que justifiquem sua proteção;
IV
- exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente
causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de
impacto ambiental, a que se dará publicidade;
V
- controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e
substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio
ambiente;
VI
- promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a
conscientização pública para a preservação do meio ambiente;
VII
- proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem
em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os
animais a crueldade.
§
2º - Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio
ambiente degradado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgão público
competente, na forma da lei.
§
3º - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão
os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e
administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.
§
4º - A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o
Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua
utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a
preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais.
§
5º - São indisponíveis as terras devolutas ou arrecadadas pelos Estados, por
ações discriminatórias, necessárias à proteção dos ecossistemas naturais.
§
6º - As usinas que operem com reator nuclear deverão ter sua localização
definida em lei federal, sem o que não poderão ser instaladas."[8]
A atual Constituição, seguindo a
tendência internacional, positivou o meio ambiente através do artigo
supracitado, elevando-o a uma categoria de interesses mais importantes, eis que
passou a considerá-lo como um direito difuso, cujo interesse de proteção compete
a todos, já que se trata de um direito transindividual, de natureza
indivisível, de que são titulares pessoas indeterminadas e ligadas em si por
circunstância de fato.[9]
Para melhor compreensão da
importância ao tema trazida à legislação brasileira, o significado de direito
difuso é explicado pelo Professor Marcelo Abelha, que ensina:
“O interesse difuso é
assim entendido porque, objetivamente estrutura-se como interesse pertencente a
todos e a cada um dos componentes da pluralidade indeterminada de que se trate.
Não é um simples interesse individual, reconhecedor de uma esfera pessoal e
própria, exclusiva de domínio. O interesse difuso é o interesse de todos e de
cada um ou, por outras palavras, é o interesse que cada indivíduo possui pelo
fato de pertencer à pluralidade de sujeitos a que se refere à norma em
questão.”[10]
Disso podemos extrair que a
Constituição descreve a importância da preservação ambiental como essencial à
proteção dos seres humanos, na medida em que um ambiente sadio é corolário do
direito a uma vida digna.
Cumpre salientar que a
constitucionalização da preservação ao ambiente é o reflexo da importante e
necessária positivação do tema, cuja essência busca-se pela fundamentação do
meio ambiente como um direito fundamental.
3.2 DIVISÃO
JURÍDICA DO DIREITO AMBIENTAL
Com o fito de facilitar a
identificação dos problemas e soluções ambientais, ainda que o direito ao
ambiente seja único, grande parte dos doutrinadores o dividem em quatro temas
principais, por pura questão metodológica, quais sejam: meio ambiente natural
ou físico, meio ambiente artificial, meio ambiente cultural e meio ambiente do
trabalho.
O meio ambiente natural ou físico é
definido no artigo 3º, inciso I, da Lei nº 6938/81, que dispõe sobre a Política
Nacional do Meio ambiente. Vejamos:
"Art 3º -
Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por:
I - meio ambiente, o conjunto de
condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica,
que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas
(...)".[11]
Ou seja, o artigo supracitado descreve
o meio ambiente natural como sendo constituído pelos recursos naturais, como o
solo, a água, o ar, a flora e a fauna.
Por
segundo, o meio ambiente artificial, que esbarra nas questões urbanas e rurais.
Este diz respeito aos prédios, praças, espaços públicos e equipamentos
comunitários que ocupam áreas dominadas pelo ser humano, que são alteradas por
construções.
Já
o meio ambiente cultural é o patrimônio histórico, artístico, ecológico,
científico e turístico. Pode tanto se tratar de bem materiais, como de bens
imateriais, como a dança, idioma e cultura de um povo.
Por
fim, o meio ambiente ao trabalho, que é considerado uma extensão do meio
ambiente artificial. Esta classificação relaciona o ambiente, as ferramentas,
as condições e os processos envolvidos no trabalho de um indivíduo, com a
finalidade de assegurar a todos uma condição digna de vida e a garantia da
salubridade e da condição positiva física e psicológica a que são submetidos os
empregados.
Essa
divisão jurídica no meio ambiente é interessante na medida em que nos mostra
como o meio ambiente afeta a vida do indivíduo e da coletividade, pois está
sempre presente em todas as atividades desenvolvidas pelos seres humanos, pelo
que deve ter uma atenção especial do Estado e da sociedade para sua proteção.
3.3 ANÁLISE DA
EXPRESSÃO "DIREITOS FUNDAMENTAIS" E SUAS DIMENSÕES
A evolução da sociedade, dos
movimentos sociais, políticos e econômicos estão ligados ao surgimento dos
direitos fundamentais, acarretando na materialização e inclusão nos
ordenamentos dos povos em geral, transformando os direitos fundamentais em
conquistas garantidas aos seres humanos.
Para uma melhor compreensão do
assunto tratado, faz-se necessária uma explanação sobre os direitos
fundamentais.
Sobre o tema, o Professor Doutor
José Joaquim Gomes Canotilho afirma que os direitos fundamentais são aqueles
direitos intrinsecamente pertencentes ao homem e que se encontram jurídica e
institucionalmente garantidos, limitados por espaço e tempo determinados. Bem
como que os direitos fundamentais são direitos objetivamente vigentes em uma
ordem jurídica concreta.[12]
O doutrinador brasileiro Alexandre de Moraes conceitua os direitos fundamentais
como:
“O conjunto institucionalizado de direitos e garantias do ser
humano que tem por finalidade básica o respeito a sua dignidade, por meio de
sua proteção contra o arbítrio do poder estatal e o estabelecimento de
condições mínimas de vida e desenvolvimento da personalidade humana”.[13]
Nesse sentido, observa-se que os
direitos fundamentais são pressupostos para a constituição da vida digna do
homem.
Para complementação da ideia, o
jurista Paulo Bonavides afirma que “são objetivos primordiais dos direitos
fundamentais criar e manter os pressupostos elementares de uma vida baseada na
liberdade e na dignidade da pessoa humana."[14]
Dessa forma, devidamente conceituada
a terminologia dos direitos fundamentais, deve-se analisar as gerações desses
direitos para a correta compreensão do enquadramento do direito do meio
ambiente no rol dos direitos consagrados como fundamentais.
Primeiramente, é importante
salientar que as gerações dos direitos fundamentais não se sobrepõem, ou seja, elas
não se substituem, tampouco são isoladas umas das outras.É por esse motivo que
a denominação "dimensão" ao invés de "geração" seria mais
adequada para evitar falsas interpretações.
As dimensões dos direitos fundamentais
refletem diferentes momentos históricos, havendo uma complementação desses
direitos na medida em foram surgindo por influência da evolução da sociedade.
Os direitos fundamentais de primeira
dimensão são aqueles integrados pelos direitos civis e políticos. Dentre os
direitos que fazem parte deste rol estão o direito à vida, à intimidade, à
inviolabilidade de domicílio, à propriedade e à igualdade perante a lei.
O doutrinador Paulo Bonavides
explica:
“Os direitos da
primeira geração são os direitos da liberdade, os primeiros a constarem do
instrumento normativo constitucional, a saber, os direitos civis e políticos,
que em grande parte correspondem, por um prisma histórico, àquela fase
inaugural do constitucionalismo do Ocidente.
[...]
Os direitos de
primeira geração ou os direitos de liberdade têm por titular o indivíduo, são
oponíveis ao Estado, traduzem-se como faculdades ou atributos da pessoa que
ostentam uma subjetividade que é seu traço mais característico; enfim, são
direitos de resistência ou de oposição perante o Estado”.[15]
Os direitos elencados como sendo de
primeira dimensão reconhecem autonomia aos particulares e independência aos
indivíduos diante do Estado. São os denominados "direitos
individuais", também conhecidos como "liberdades civis".[16]
Esses
direitos são considerados e valorizados como de resistência perante o Estado,
sendo chamados por este motivo como direitos negativos, algo como “agir ou não
agir, fazer ou não fazer. Usar ou não usar. Ir, vir ou ficar”.[17]
Os direitos fundamentais de segunda
geração aparecem com o modelo de Estado Social de Direito,que surgiu logo após o
encerramento da Primeira Guerra Mundial, em decorrência da observação da
degradação da vida humana no conflito.
Esse rol de direitos reclama do
Estado ações que propiciem as mínimas condições de dignidade à pessoa humana.
Daí surgem os direitos sociais, econômicos e culturais, com a clara intenção de
diminuir a desigualdade social e ampliar a proteção aos desfavorecidos.
O que distingue os direitos
fundamentais de segunda geração dos direitos da dimensão anterior é seu caráter
positivo, pois deixa de ter como foco principal evitar a intervenção do Estado
na esfera liberal individual para a preocupação de propiciar o bem-estar
social.
É o que ensina o Professor Doutror
Pietro Alarcón:
“A
partir da terceira década do século XX, os Estados antes liberais começaram o
processo de consagração dos direitos sociais ou direitos de segunda geração,
que traduzem, sem dúvida, uma franca evolução na proteção da dignidade humana.
Destarte, o homem, liberto do jugo do Poder Público, reclama uma nova forma de
proteção da sua dignidade, como seja, a satisfação das carências mínimas,
imprescindíveis, o que outorgará sentido à sua vida".[18]
Isto posto, os direitos acima
referidos estão anexos à direitos sociais que o Estado deve prestar ao
indivíduo, como educação, saúde, cultura, trabalho, lazer, assistência social,
entre outros.
A proteção internacional dos
direitos humanos voltada mais especificamente para a essência do ser humano e
para o destino da humanidade surgiu logo após a Segunda Guerra Mundial, com a
criação de entidades como a Organização das Nações Unidas. O pensamento em
relação ao ser humano passou a ser não mais adstrito ao indivíduo ou à uma
coletividade determinada, mas sim como gênero. [19]
Foi então que começaram a aparecer os direitos chamados de terceira dimensão,
entre eles o direito ao desenvolvimento, à paz,
à comunicação, ao meio-ambiente, à conservação do patrimônio histórico e
cultural da humanidade, entre outros.
Por estarem voltados à humanidade
como um todo, são considerados direitos coletivos por excelência. Nesse sentido,o
professor Paulo Bonavides conceitua:
“Dotados
de altíssimo teor de humanismo e universalidade, os direitos da terceira
geração tendem a cristalizar-se neste fim de século enquanto direitos que não
se destinam especificamente à proteção dos interesses de um indivíduo, de um
grupo, ou de um determinado Estado. Têm primeiro por destinatário o gênero
humano mesmo, num momento expressivo de sua afirmação como valor supremo em
termos de existencialidade concreta. Os publicistas e juristas já o enumeram
com familiaridade, assinalando-lhe o caráter fascinante de coroamento de uma
evolução de trezentos anos na esteira da concretização dos direitos fundamentais.
Emergiram eles da reflexão sobre temas referentes ao desenvolvimento, à paz, ao
meio ambiente, à comunicação e ao patrimônio comum da humanidade”[20]
Pela
característica de valorização de um ambiente equilibrado, da qualidade de vida,
paz, progresso e autodeterminação, os direitos de terceira geração são também
conhecidos como "direitos de solidariedade e fraternidade". Como se
vê nos ensinamentos de Luiz Alberto Araújo e Vidal Serrano Neves Júnior:
“A essência desses direitos se encontra em
sentimentos como a solidariedade e a fraternidade, constituindo mais uma
conquista da humanidade no sentido de ampliar os horizontes de proteção e
emancipação dos cidadãos”.
(...)
Enfoca-se o ser
humano relacional, em conjunção com o próximo, sem fronteiras físicas ou
econômicas.”[21]
Tendo
em vista que os direitos desta dimensão são voltados à proteção do homem, sendo
estes direitos transindividuais, o direito à vida passa a ser visto como um
direito possível de ser lesado. É da preocupação em proteger o direito à vida
que emana a necessidade de proteção ao meio ambiente, uma vez que para se
assegurar uma vida digna aos seres humanos é preciso um ambiente sadio para se viver.
Assim,
após a Declaração de Estocolmo, passou-se a considerar o direito ao ambiente
digno e sadio como um direito fundamental de terceira geração, que não pode ser
violado.
Sobre
este importante tema, o Professor Doutor Ingo Sarlet leciona:
"A nota distintiva destes direitos de terceira geração
reside basicamente na sua titularidade coletiva, muitas vezes indefinida e
indeterminável, o que se revela, a título de exemplo, especialmente no direito
ao meio ambiente e qualidade de vida, o qual, em que pese ficar preservada sua
dimensão individual, reclama novas técnicas de garantia e proteção. A
atribuição da titularidade de direitos fundamentais ao próprio Estado e à Nação
(direito à autodeterminação, paz e desenvolvimento) tem suscitado sérias dúvidas
no que concerne à própria qualificação de grande parte destas reivindicações
como autênticos direitos fundamentais."[22]
Sendo
os direitos de terceira geração de natureza coletiva, indeterminável ou
indefinida, tendo como foco principal a proteção do homem, sua eficácia está
intimamente ligada à participação da sociedade e dos Estados em nível
internacional.
Além
das três dimensões citadas acima, uma parte dos doutrinadores discorre sobre a
existência dos direitos de quarta dimensão. Dentre os defensores desta
corrente,Paulo Bonavides afirma que "os direitos de quarta geração
compreenderiam o futuro da cidadania e o porvir da liberdade de todos os povos.
Tão somente com eles será legítima e possível a globalização política”.[23]
O
direito à democracia, à informação e ao pluralismo são defendidos por esta
dimensão, que procura torná-los efetivos através da igualdade e fraternidade. Seriam
incluídos neste rol os chamados "novos direitos", que são de natureza
complexa, polêmica e interdisciplinar, quais sejam a bioética, a engenharia
genética, a biotecnologia, ou seja, temas que se relacionam à polêmicas como
clonagem e eutanásia. [24]
Ainda,
há quem defenda os direitos de quinta geração, que, nas palavras do doutrinador
Oliveira Júnior"nascem do grande desenvolvimento da cibernética na
atualidade, implicando no rompimento de fronteiras tradicionais, estabelecendo
conflitos entre países com realidades distintas, via internet, por exemplo”. [25]
Em
suma, pode-se constatar que os vários momentos históricos pelos quais passa a
humanidade gera novos problemas que precisam ser solucionados através de novas
normas, de forma a garantir a proteção dos direitos do homem.
Entre
as preocupações já reconhecidas pelo direito está o meio ambiente, positivado
nos direitos de terceira geração, e que até hoje se mostra um desafio.
3.4 O MEIO
AMBIENTE COMO DIREITO FUNDAMENTAL DE TERCEIRA DIMENSÃO
Como já citado anteriormente, o
início da preocupação dos Estados com a proteção ao ambiente surgiu após a
Declaração de Estocolmo, ocorrida em 1972, durante a Conferência das Nações
Unidas sobre o Meio Ambiente Humano.
Nesta Declaração pioneira, onde
foram elaborados 26 princípios, encontramos:
“Princípio1 - O homem tem direito fundamental à
liberdade, à igualdade e condições de vida adequadas, em um meio ambiente de
qualidade tal que lhe permita levar uma vida digna, gozar de bem-estar e é
portador solene de obrigação de proteger e melhorar o meio ambiente, para as
gerações presentes e futuras.
Princípio 2 - Os recursos naturais da Terra,
incluídos o ar, a água, o solo, a flora e a fauna e, especialmente, parcelas
representativas dos ecossistemas naturais, devem ser preservados em benefício
das gerações atuais e futuras, mediante um cuidadoso planejamento ou
administração adequada.”[26]
Assim, o meio ambiente foi então
consagrado como um direito fundamental do ser humano. Este foi o marco para, a
partir deste momento, começarem a surgir dispositivos no intuito de garantir a
proteção a um ambiente sadio e equilibrado, de forma a manter elevada a
qualidade de vida dos seres humanos.
Para que se possa garantir um meio
ambiente ecologicamente equilibrado, é necessária a efetividade dos demais
direitos fundamentais elencados na Constituição, uma vez que não se pode
conceber uma vida digna sem saúde, bem estar, lazer e qualidade de vida. Nessa
medida, aparece então o compromisso do Estado em instituir políticas públicas
necessárias e eficazes para tornar realidade o ambiente saudável, bem como a
cooperação da sociedade na conscientização da ética ambiental.
É este o entendimento da Professora
Doutora Fernanda Luiza Fontoura Medeiros:
"A relação entre
os direitos humanos e a proteção ao meio ambiente adotou diversas formas quando
se pode perceber que a deterioração ambiental poderia impedir o gozo de
direitos já reconhecidos como fundamentais ao ser humano, desde os casos mais
extremos do direito à vida, à saúde, aos direitos culturais e de patrimônio
histórico. (...)
A consciência desta interação
entre os direitos humanos e o direito ao meio ambiente tem contribuído
decisivamente com a evolução da internacionalização, com a globalização da
proteção de ambos os direitos referendados. Não há, com efeito, como se
pretender salvaguardar o direito humano à vida, sem proteger o meio em que esta
vida se desenvolve."[27]
O direito ao ambiente consagrado na
Constituição Brasileira está elencado como de tríplice dimensão, ou seja, tem
caráter individual, social e intergeracional.
Individual, pois a qualidade de vida
que busca se alcançar é considerada em sua individualidade, ou seja, interessa
a cada ser humano possuir uma vida sadia em um meio ambiente equilibrado.
Social porque o direito ao meio
ambiente é de interesse difuso, uma vez que faz parte do patrimônio coletivo e,
ainda que possua caráter individual, não há como um indivíduo se apropriar do
meio ambiente para seu próprio consumo.
Intergeracional, uma vez que a
defesa do ambiente hoje irá refletir no mundo das gerações futuras.
Ensina o Professor Doutor José
Joaquim Gomes Canotilho que o meio ambiente equilibrado é compreendido tanto
pela perspectiva subjetiva quanto pela objetiva. A primeira diz respeito à relevância
das normas idealizadoras de direitos fundamentais na vida do ser humano e a
importância destas na esfera privada e na satisfação de interesses pessoais. Já
a esfera objetiva está ligada aos valores da norma que emanam da coletividade,
com a natureza de interesse público, tratando-se de uma fundamentação objetiva
de norma consagradora da vivência comunitária.[28]
Diante disso, podemos observar que a
dimensão coletiva do direito ao ambiente, eis que é direito fundamental de
terceira geração, não afasta a dimensão individual garantida aos seres humanos.
No entanto, deve sempre prevalecer o interesse comum.
Contudo, a grande dificuldade
encontrada no que diz respeito à preservação ao ambiente está justamente na
seara coletiva, o que requer o interesse do Estado em estar pronto quando for
necessário intervir, uma vez que cabe a ele zelar pelo direito da coletividade,
do indivíduo e do próprio Estado, através de seu poder de defesa ao ambiente
constante na Constituição.
Além dos direitos fundamentais,
devemos lembrar também da existência dos deveres fundamentais. Respeitar o meio
ambiente e garantir-lhe uma tutela eficaz são deveres fundamentais não
autônomos, ou seja, estão positivados na Constituição Brasileira e conexos ao
direito fundamental ao meio ambiente equilibrado.
Através
dos deveres fundamentais, é possível até mesmo garantir a tutela do Estado em
relação às plantas e animais, mesmo estes sendo desprovidos de personalidade
jurídica, ou seja, há determinados destinatários que não possuem a titularidade
do direito ao ambiente, porém ainda assim carecem e têm proteção ambiental.[29]
Nesse sentido, se pronuncia
Habermas:
"(...) um
reconhecimento recíproco de sujeitos, ao menos potencialmente livres e iguais,
constitui uma necessidade conceitual e determina o status dos deveres frente
aos animais assimetricamente [instituídos]; os animais não têm direito frente
aos homens, mas os homens têm deveres frente aos animais."[30]
Dessa forma, nítido é o dever
fundamental de proteção ao ambiente em favor não só da humanidade, como também
em face daqueles que não possuem personalidade jurídica e, em regra, não teriam
a proteção garantida. Desta feita, podemos afirmar que todas as ações e defesas
relacionadas ao meio ambiente devem ser elaboradas por todo o globo, e não apenas
por determinados Estados, uma vez que devem atingir todos os povos.
Um exemplo atual disto é a poluição
atmosférica, que afeta a todos e necessita da tutela global pelo meio dos
deveres, e não dos direitos, eis que é através do dever que se obtém a força
para obrigar os indivíduos a criarem medidas de proteção.
3.5 EFEITOS
JURÍDICOS DO DIREITO AO AMBIENTE
O direito a um meio ambiente
equilibrado carrega consigo as seguintes características: imprescritibilidade,
inalienabilidade, irrenunciabilidade, caracterização como cláusula pétrea e
interpretação mais favorável em caso de conflitos de normas.
A imprescritibilidade se traduz à
não limitação de tempo do exercício do direito de proteção ao ambiente, sendo
que pode-se acessá-lo judicialmente a qualquer momento. Tal fato se dá pela
natureza indisponível dos direitos fundamentais.
A inalienabilidade do direito ao
ambiente se dá por sua característica de titularidade difusa, ou seja, pertence
tanto ao indivíduo quanto à coletividade. Não se pode alienar algo garantido a
toda a humanidade, pois trata-se de um direito indisponível.
Em terceiro, está a
irrenunciabilidade. O titular de um direito fundamental não pode renunciá-lo,
no entanto, lhe é cabível não usufruir do direito que possui.
Os direitos e garantias individuais
protegidos pelo texto constitucional brasileiro em seu artigo 60, §4º não podem
sofrer mudanças legislativas que tenham como objetivo os diminuir ou abolir.
São as chamadas cláusulas pétreas. Estando o direito ao ambiente inserido no
rol dos direitos fundamentais, este está sob o abrigo da cláusula pétrea. Sendo
o direito ambiental tratado desta maneira, é possível garantir um meio ambiente
sadio e equilibrado para as futuras gerações.
O direito ao ambiente se encontra no
topo da escala hierárquica dos direitos, uma vez que está inserido como um
direito fundamental. Em razão disso, na eventual necessidade de aplicação de
normas que sejam conflitantes, este terá primazia em relação às demais.
Ressalte-se que, no caso de haver
colisão de dois bens distintos, de natureza fundamental, cabe ao intérprete e
aplicador da norma fazer a devida ponderação entre eles, através do sacrifício
mínimo dos direitos em jogo, com base nos princípios da unidade da
Constituição, da concordância prática e da proporcionalidade, dentre outros.[31]
Portanto, ao ser trazido para o rol
dos direitos fundamentais, o direito ao ambiente passa a ter grande relevância
para o ordenamento jurídico brasileiro. Importância esta que se infere das
marcantes características de ser um direito imprescritível, inalienável,
irrenunciável, irrevogável e preferencial, sinalizando a evolução do pensamento
em relação ao meio ambiente.
4 DIREITO AO AMBIENTE X DIREITO AO
DESENVOLVIMENTO
Uma das principais discussões relativas
ao tema diz respeito ao desenvolvimento econômico e a proteção ao meio ambiente.
Muitos acreditam se tratar de
direitos antagônicos, que não são possíveis de conciliar. No entanto, muitos
doutrinadores acreditam que a junção equilibrada destes dois direitos pode ser
realizada.
O direito ao desenvolvimento é,
assim como o direito ao ambiente, um direito fundamental de terceira dimensão,
devidamente protegido pelo texto constitucional. Ainda, os dois aparecem
dispostos na Lei 6.938/81 de forma a harmonizar a existência de ambos:
"Art. 2º. A Política
Nacional do Meio Ambiente tem por objetivo a preservação, melhoria e
recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando assegurar, no País,
condições ao desenvolvimento sócio-econômico, aos interesses da segurança
nacional e à proteção da dignidade da vida humana."
"Art. 4º. A
Política Nacional do Meio Ambiente visará:
I- a compatibilização
do desenvolvimento econômico-social com a preservação da qualidade do meio
ambiente e do equilíbrio ecológico."[32]
Pelo que se depreende do texto transcrito,
a vivência em um meio sadio e equilibrado é essencial para garantir uma vida
digna aos seres humanos, com a qualidade de vida a que necessitam e,
consequentemente, o impulso para o desenvolvimento. É a partir da junção da
proteção ao meio ambiente e do direito ao desenvolvimento que surge o conceito
de desenvolvimento sustentável, muito em voga atualmente.
A primeira aparição desta
denominação foi apresentada no Relatório Bruntland, em 1987. O documento foi
elaborado pela Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento e
apresentou uma visão inovadora sobre o tema, ao definir que este deve satisfazer
as necessidades presentes, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de
suprir suas próprias necessidades”.[33]
O Relatório mostra que não é
necessária a estagnação do desenvolvimento econômico, desde que haja
conciliação com as questões ambientais e sociais.
Para tal, é de fundamental
importância que os Estados incluam em seus projetos de desenvolvimento estudos
sobre o impacto ambiental nos locais onde pretendem intervir.
É imperativa a necessidade da
concordância prática entre os direitos fundamentais de desenvolvimento e do
ambiente, com a finalidade de se aproveitar ao máximo os benefícios de ambos,
sem sacrificar o conteúdo que carregam.[34]
A respeito do tema, o Supremo
Tribunal Federal se manifestou:
"Meio ambiente -
direito à preservação de sua integridade (CF, art. 225) - prerrogativa
qualificada por seu caráter de metaindividualidade - direito de terceira
geração (ou de novíssima dimensão) que consagra o postulado da solidariedade -
necessidade de impedir que a transgressão a esse direito faça irromper, no seio
da coletividade, conflitos intergeneracionais - espaços territoriais
especialmente protegidos (CF, art. 225, § 1º, III) - alteração e supressão do
regime jurídico a eles pertinente - medidas sujeitas ao princípio
constitucional da reserva de lei - supressão de vegetação em área de
preservação permanente - possibilidade de a Administração Pública de, cumpridas
as exigências legais, autorizar, licenciar ou permitir obras e/ou atividades
nos espaços territoriais protegidos, desde que respeitada, quanto a estes, a
integridade dos atributos justificadores do regime de proteção especial -
relações entre economia (CF, art. 3º, ii, c/c o art. 170, vi) e ecologia (cf,
art. 225) - colisão de direitos fundamentais - critérios de superação desse
estado de tensão entre valores constitucionais relevantes - os direitos básicos
da pessoa humana e as sucessivas gerações (fases ou dimensões) de direitos (RTJ
164/158, 160-161) - a questão da precedência do direito à preservação do meio
ambiente: uma limitação constitucional explícita à atividade econômica (CF,
art. 170, VI) - decisão não referendada - conseqüente indeferimento do pedido de
medida cautelar. A preservação da integridade do meio ambiente: expressão
constitucional de um direito fundamental que assiste à generalidade das
pessoas. - Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.
Trata-se de um típico direito de terceira geração (ou de novíssima dimensão),
que assiste a todo o gênero humano (RTJ 158/205-206). Incumbe, ao Estado e à
própria coletividade, a especial obrigação de defender e preservar, em
benefício das presentes e futuras gerações, esse direito de titularidade
coletiva e de caráter transindividual (RTJ 164/158-161). O adimplemento desse
encargo, que é irrenunciável, representa a garantia de que não se instaurarão,
no seio da coletividade, os graves conflitos intergeneracionais marcados pelo
desrespeito ao dever de solidariedade, que a todos se impõe, na proteção desse
bem essencial de uso comum das pessoas em geral. Doutrina. A atividade
econômica não pode ser exercida em desarmonia com os princípios destinados a
tornar efetiva a proteção ao meio ambiente. - A incolumidade do meio ambiente
não pode ser comprometida por interesses empresariais nem ficar dependente de
motivações de índole meramente econômica, ainda mais se se tiver presente que a
atividade econômica, considerada a disciplina constitucional que a rege, está
subordinada, dentre outros princípios gerais, àquele que privilegia a
"defesa do meio ambiente" (CF, art. 170, VI), que traduz conceito
amplo e abrangente das noções de meio ambiente natural, de meio ambiente
cultural, de meio ambiente artificial (espaço urbano) e de meio ambiente
laboral. Doutrina. Os instrumentos jurídicos de caráter legal e de natureza
constitucional objetivam viabilizar a tutela efetiva do meio ambiente, para que
não se alterem as propriedades e os atributos que lhe são inerentes, o que
provocaria inaceitável comprometimento da saúde, segurança, cultura, trabalho e
bem-estar da população, além de causar graves danos ecológicos ao patrimônio
ambiental, considerado este em seu aspecto físico ou natural. A questão do
desenvolvimento nacional (cf, art. 3º, ii) e a necessidade de preservação da
integridade do meio ambiente (cf, art. 225): o princípio do desenvolvimento
sustentável como fator de obtenção do justo equilíbrio entre as exigências da
economia e as da ecologia. - O princípio do desenvolvimento sustentável, além
de impregnado de caráter eminentemente constitucional, encontra suporte
legitimador em compromissos internacionais assumidos pelo Estado brasileiro e
representa fator de obtenção do justo equilíbrio entre as exigências da
economia e as da ecologia, subordinada, no entanto, a invocação desse
postulado, quando ocorrente situação de conflito entre valores constitucionais
relevantes, a uma condição inafastável, cuja observância não comprometa nem
esvazie o conteúdo essencial de um dos mais significativos direitos
fundamentais: o direito à preservação do meio ambiente, que traduz bem de uso
comum da generalidade das pessoas, a ser resguardado em favor das presentes e
futuras gerações."[35]
Observa-se que, na decisão da Corte
Suprema brasileira, os magistrados aplicaram justamente este conceito de
desenvolvimento sustentável, visando conciliar o direito ao ambiente com o
direito ao desenvolvimento. Ainda, o julgado chama a atenção para o fato de que
ambos direitos são compatíveis, devendo ser aplicados conjuntamente para
preservar outros direitos dos cidadãos.
A harmonização desses direitos é uma
tendência mundial, sendo que o desenvolvimento sustentável vem sendo buscado
cada vez mais pelos Estados, conscientes de sua importância e necessidade.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Considerar o direito ao ambiente
como sendo um direito fundamental foi um grande passo para a humanidade no que
se refere à preservação dos recursos naturais,
da qualidade de vida e do equilíbrio da vida na Terra.
No entanto, a proteção ao ambiente,
ainda que tutelada em vários dispositivos na legislação brasileira, precisa
sobremaneira da atenção especial do Estado. Por mais que normas protetivas existam,
muitas vezes não se consegue uma efetiva aplicação destas, e a crise ambiental
global é reflexo disso.
Apenas a positivação do direito ao
ambiente, sem uma efetiva aplicação e fiscalização do cumprimento das normas se
configura como uma medida meramente paliativa, o que acaba por agravar ainda
mais a crise.
Felizmente há uma crescente
conscientização mundial no que se refere à proteção ao meio ambiente, gerando
inúmeros debates acerca do assunto. Em meio a essas discussões, surge talvez o
mais importante conceito ambiental, que pode vir a ser a chave para o sucesso
desta cruzada global: o desenvolvimento sustentável.
Ao conseguir aliar a proteção do
meio em que vivemos com o desenvolvimento da humanidade, harmonizando ambos, é
possível amenizar a crise que enfrentamos e, quem sabe, reverter o quadro para
legar mais esperança às gerações futuras.
[1] CRETELLA JUNIOR, José, Comentários à Constituição 1988, Vol.
VIII Ed. Forense Universitária, 2ª Ed, p. 4517.
[2] AMOY, Rodrigo de
Almeida. A proteção do direito
fundamental ao meio ambiente no direito interno e internacional. Disponível
em:
<http://www.conpedi.org.br/manaus/arquivos/anais/bh/rodrigo_de_almeida_amoy.pdf>.
Acesso em: 06 mai. 2013.
[3] ANGELIN, Rosângela. A crise ambiental e a insuficiência das
legislações. Disponível em:
<http://www.arede.org.br/index.php?option=com_content&view=article&id=79:-a-crise-ambiental-e-a-insuficiencia-das-legislacoes&catid=48:agroecologia&Ite
mid=28>. Acesso em: 03 mai. 2013.
[4] MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 11. ed.
São Paulo: Malheiros, 2003. p. 65.
[5] FARIAS, Talden Queiroz. O conceito jurídico de meio ambiente. Âmbito Jurídico. Disponível em:<http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=1546>. Acesso em: 05
mai. 2013.
[6] BRASIL. Lei nº 6.938, de 31 de agosto
de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e
mecanismos de formulação e aplicação e dá outras providências. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6938.htm>.
Acesso em 06 mai. 2013.
[7] FIORILLO, Celso A. P., Curso de Direito Ambiental Brasileiro,
12. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2011.
[8] BRASIL. Constituição (1988).
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>.
Acesso em 06 mai. 2013.
[9]O
conceito legal de interesses ou direitos difusos encontra-se no artigo 81,
parágrafo único, inciso I do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/1990).
[10] ABELHA,
Marcelo. Ação Civil Pública e Meio Ambiente. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense
Universitária, 2004.
[11] BRASIL. Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981.
Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de
formulação e aplicação e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6938.htm>.
Acesso em 06 mai. 2013.
[12] CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da
Constituição. Coimbra: Almedina, 1998. p. 359.
[13] MORAES, Alexandre de. Direitos
humanos fundamentais: Teoria Geral. 4ªed. São Paulo: Atlas, 2002.
[14]
BONAVIDES, Paulo. Curso de direito
constitucional. São Paulo: Malheiros, 2000. p. 472.
[15]BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional.
18. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 563-564.
[16]SILVA, José Afonso
da. Curso de
direito constitucional positivo. 20.
ed. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 182-183.
[17]ARAUJO, Luiz Alberto
David; NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano. Curso
de Direito Constitucional. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 116
[18]ALARCÓN, Pietro de
Jésus Lora. O patrimônio
genético humano e sua proteção na Constituição Federal de 1988. São Paulo:
Método, 2004, p. 79.
[19]ARAUJO, Luiz Alberto
David; NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano. Curso
de Direito Constitucional. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 116
[20]BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional.
18. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 563-569.
[21]ARAUJO, Luiz Alberto
David; NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano. Curso
de Direito Constitucional. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 116.
[22]SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais.
Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1998. p. 54.
[23]BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. São Paulo: Malheiros, 2000.
p.524-525.
[24] RITT, Leila Eliana Hoffmann. O desenvolvimento sustentável e o meio
ambiente como forma de concretização dos direitos fundamentais de terceira
dimensão. Disponível em:
<http://sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/071206652.pdf>.
Acessado em: 05 mai. 2013.
[25] OLIVEIRA JUNIOR, Jose Alcebiades. Teoria jurídica e novos direitos. Rio
de Janeiro: Lumen Juris, 2000. p. 105. v. 1
[26]
DECLARAÇÃO DE ESTOCOLMO. Disponível em: <http://www.silex.com.br/leis/normas/estocolmo.htm>.
Acesso em: 05 mai. 2013.
[27] MEDEIROS, Fernanda Luiza Fontoura. Meio ambiente: direito e dever fundamental.
Porto Alegre:Livraria do Advogado, 2004. p. 32.
[28] CANOTILHO, Jose Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da
Constituição. Lisboa: Amedina, 2000. p. 1178
[29] REITZ, Rebeca
Monteiro. Meio ambiente: instrumentos
judiciais coletivos de proteção. 179f. Dissertação (Mestrado) -
Universidade da Amazônia, Belém, 2008.
[30] HABERMAS, Jüngen. Aclariaciones a la ética del discurso.
Madrid: Editorial Trotta, 1999. p. 73.
[31]FARIAS, Edilsom Pereira de. Colisão de
direitos: a honra, a intimidade, a vida
privada e a imagem versus a liberdade de expressão e informação. 2. ed.
atual. Porto Alegre: Fabris, 2000. p. 53.
[32] BRASIL. Lei nº 6.938, de 31 de agosto
de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e
mecanismos de formulação e aplicação e dá outras providências. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6938.htm>.
Acesso em 06 mai. 2013.
[33] MUDANÇAS
CLIMÁTICAS. Relatório Brundtland e a sustentabilidade.
Disponível em: <http://www.mudancasclimaticas.andi.org.br/node/91>.
Acesso em: 06 mai. 2013.
[34] BARCELLOS, Ana Paula de. Ponderação, racionalidade e atividade
jurisdicional. Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p. 133-139.
[35] BRASIL, Supremo Tribunal Federal.
Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade
n. 3.540/DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, j.
01.09.2005. Disponível em: www.stf.gov.br.
Acesso em: 06.05.2013.
Camila Simão
Nº 23912
Subturma 3
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