sexta-feira, 17 de maio de 2013

DIREITO AO AMBIENTE COMO DIREITO FUNDAMENTAL À LUZ DA CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA


        Atualmente o ambiente se enquadra como uma das maiores preocupações na maioria dos países. A degradação ambiental trás insegurança à humanidade no que toca ao futuro da espécie humana com qualidade e dignidade, nos mostrando a importância da preservação e conservação de um meio ambiente equilibrado.
       O presente artigo tem como objetivo apresentar o direito ao ambiente como um direito fundamental, demonstrando a importância de considerá-lo como tal para que a sua proteção seja ampla e efetiva.
          Inicialmente, será abordada a origem da visão de ambiente como um fator determinante para a preservação da vida humana, bem como a crise ambiental pela qual passa o mundo contemporâneo. Na sequência, serão apresentadas as dimensões dos direitos fundamentais, justificando a classificação do direito ao ambiente neste rol. Finalmente, será tratada a possibilidade de aliar o direito ao desenvolvimento com o direito ao ambiente, sem a necessidade de sacrificar um ou outro.

2 A CRISE AMBIENTAL NO MUNDO

            Observando a posição do ser humano em relação à natureza, podemos constatar que muitas vezes a encaramos como superior às outras espécies que nela habitam, pois somos capazes de promover sensíveis alterações no meio ambiente. Isso, consequentemente, aumenta a nossa responsabilidade, uma vez que nossas ações em sua grande maioria causam significativas mudanças no equilíbrio ecológico do planeta.
          A respeito do tema, o Professor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, José Cretella Júnior, explana:

“(...) o aparecimento do homem, no planeta, passou a incidir, aos poucos, no meio ambiente, alterando-lhe o natural equilíbrio, quando o ser humano necessitou das coisas da natureza, utilizando-as para a alimentação ou para abrigar-se das intempéries."
(...)
“No início, praticamente desprezível, a ação humana vai depois, aos poucos, afetando o equilíbrio do meio circunvizinho e, nas últimas décadas, em razão do avanço tecnológico e do aumento extraordinário da poluição mundial, constituiu-se em ameaça flagrante ao próprio destino da humanidade, que sem a menor dúvida, se extinguirá, a não ser que os governantes e toda a comunidade internacional, em conjunto, detenham a ação predatória do homem, que se faz sentir por motivos imediatistas traduzidos em omissões e atos positivos, destruidores da vida terrestre, marinha, atmosférica e estratosférica. Guerras,vazamentos de usinas nucleares e de petroleiros, fábricas de móveis,indústrias, escapamentos dos carros e chaminés, descargas das fábricas destroem a fauna marítima, fluvial e lacustre, as reservas florestais, o ar atmosférico, colocando terra, mar e ar, em vias de colapso total. Resta, se ainda houver tempo e consenso geral, a ação imediata de governantes e legisladores para deter a ação predatória do homem, à beira da destruição[1]


            Percebe-se que o doutrinador, em sua obra, alerta para as alterações negativas provocadas pelo ser humano, muito em razão do avanço tecnológico e do aumento populacional, além das guerras e desastres ambientais, que também impactam de maneira prejudicial no meio ambiente, fatores estes que podem vir a ser a causa da extinção da própria humanidade se não forem tomadas atitudes urgentes e efetivas em sentido contrário.
            Em razão da interferência humana, a biosfera se encontra ameaçada. Os recursos naturais são utilizados de forma predatória e a população gera resíduos sem controle. Dessa forma, o nível da qualidade de vida do planeta diminuiu, afetando o equilíbrio entre sociedade, recursos naturais disponíveis e resíduos depositados no ambiente.
         Em razão do cenário mundial atual, surgiram discussões em torno da temática ambiental, as quais ocupam posição de destaque internacionalmente.
            Os países que elaboraram seus textos constitucionais a partir de 1970 passaram a inserir o meio ambiente no rol dos direitos que deveriam possuir a tutela do Estado. Essa mudança decorreu principalmente após a Conferência de Estocolmo, na Suécia, ocorrida em 1972. Esse evento, de extrema importância, passou então a ser considerado como o marco do movimento ecológico mundial.
            Os países que inseriram a proteção ao meio ambiente em sua Constituição foram, dentre eles, a Suíça, através de Emenda à Constituição em 1957; a Bulgária, em 1971; o Panamá e o Chile, em 1972; a antiga Iugoslávia, em 1974; a Grécia, em 1975; a Cuba, em 1976; a antiga União Soviética, em 1977; a China, em 1978; o Peru, em 1980 e a Argentina, em 1994.
  No entanto, as primeiras Constituições que correlacionaram o direito ao meio ambiente ao direito à vida foram Portugal, em 1976,como se vê no artigo 66 da Carta Magna, e a Espanha, em 1978, conforme o texto disposto no artigo 45 da Lei Maior.[2]
             A Constituição Portuguesa trata o ambiente como um bem jurídico tutelável, onde se considera como direito fundamental do homem o direito de proteção ao meio ambiente, tratando-o não apenas como um direito, mas também impondo aos cidadãos o dever de defendê-lo, demonstrando a importância dada ao tema.
            Do mesmo modo, o texto constitucional atribui ao Estado a responsabilidade de criar e manter organismos próprios que assegurem a preservação e conservação dos recursos naturais, visando a geração de políticas ecológicas.
No Brasil, até a Constituição promulgada em 1988, não se falava em proteção ao ambiente de forma global. Eram tratados apenas assuntos como a competência legislativa da União e proteção ao patrimônio histórico e cultural. A mudança mostrou a evolução na mentalidade do país em relação aos problemas decorrentes da falta de proteção ao ambiente e as consequências que poderiam acarretar para a sociedade.
            No entanto, ainda hoje as legislações ambientais ao redor do mundo não apresentam grandes soluções efetivas devido à deficiência na organização política e ideológica dos Estados de Direito, que acabam por priorizar a exploração do ambiente pelos seres humanos com o propósito de atingir um maior desenvolvimento econômico, princípio que também é garantido pelas Constituições através da livre iniciativa, que muitas vezes é sobreposta ao ambiente. [3]
            Destarte, observa-se que não é suficiente a simples criação de legislações ambientais se a cada conflito de interesses o meio ambiente for sobreposto por outro direito em prol do argumento de desenvolvimento econômico.
            Este tipo de medida é um grande avanço sobre a questão ambiental, mas, por si só, não soluciona o problema. É preciso criar mecanismos de proteção e fiscalização efetiva do cumprimento da legislação, tratando-a com a máxima prioridade, sob pena de a crise ambiental que enfrentamos no mundo todo se tornar irreversível, condenando severamente diversas espécies de fauna e flora, inclusive a humanidade.

3 O MEIO AMBIENTE NA CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA
3.1 CONCEITO DE MEIO AMBIENTE

            A palavra ambiente, originada do latim “ambiens, entis, isto é, o que rodeia", tem entre seus significados o meio em que vivemos, de acordo com Paulo Affonso Leme Machado.[4]
            A expressão "meio ambiente", utilizada com frequência no Brasil, gera controvérsia entre os doutrinadores por ser inadequada, uma vez que se torna redundante se considerarmos que "meio" e "ambiente" são palavras sinônimas. É por este motivo que países como Portugal e Itália se utilizam apenas da palavra "ambiente".[5]
            Como a cada dia o ambiente passa a ter mais espaço na mídia, em razão do aumento de problemas ambientais, o conceito que muitas vezes se faz entender é de que o ambiente tem o mesmo significado que natureza ou recursos naturais, o que acaba por retirar o peso das decisões políticas e ideológicas por trás do tema. Em realidade, o conceito jurídico de ambiente vai além.
            No Brasil, a Lei nº 6938/81, que versa sobre Política Nacional do Meio Ambiente, conceitua:


"Art 3º - Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por:
I - meio ambiente, o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas;
(...)"[6]


            O entendimento do conceito de ambiente extraído da legislação é amplo, podendo ser entendido como a natureza em geral de forma integrativa, englobando a ideia de ecossistema e considerando cada recurso ambiental como dependente um do outro,sendo indivisíveis.
             O doutrinador Celso Antônio Pacheco Fiorillo, afirma tratar-se de um conceito jurídico indeterminado, colocado de maneira proposital pelo legislador com a clara intenção de criar um espaço positivo de incidência da norma. Ou seja, se houvesse uma definição precisa de meio ambiente, diversas situações, que normalmente seriam subsumidas na órbita de seu conceito atual, poderiam deixar de sê-lo pela eventual criação de um espaço negativo próprio de qualquer definição.[7]
            O artigo 225 da Constituição Brasileira exerce o papel de principal norteador do meio ambiente, devido a seu complexo teor de direitos, mensurando como obrigação do Estado e da Sociedade a garantia de preservação e cuidado do meio ambiente, uma vez que se trata de um bem comum do povo.
            É o que se depreende do artigo abaixo transcrito:

"Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
§ 1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:
I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas; 
II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético;
III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção;
IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade;
V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente;
VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente;
VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.  
§ 2º - Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da lei.
§ 3º - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.
§ 4º - A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais.
§ 5º - São indisponíveis as terras devolutas ou arrecadadas pelos Estados, por ações discriminatórias, necessárias à proteção dos ecossistemas naturais.
§ 6º - As usinas que operem com reator nuclear deverão ter sua localização definida em lei federal, sem o que não poderão ser instaladas."[8]


            A atual Constituição, seguindo a tendência internacional, positivou o meio ambiente através do artigo supracitado, elevando-o a uma categoria de interesses mais importantes, eis que passou a considerá-lo como um direito difuso, cujo interesse de proteção compete a todos, já que se trata de um direito transindividual, de natureza indivisível, de que são titulares pessoas indeterminadas e ligadas em si por circunstância de fato.[9]
            Para melhor compreensão da importância ao tema trazida à legislação brasileira, o significado de direito difuso é explicado pelo Professor Marcelo Abelha, que ensina:

“O interesse difuso é assim entendido porque, objetivamente estrutura-se como interesse pertencente a todos e a cada um dos componentes da pluralidade indeterminada de que se trate. Não é um simples interesse individual, reconhecedor de uma esfera pessoal e própria, exclusiva de domínio. O interesse difuso é o interesse de todos e de cada um ou, por outras palavras, é o interesse que cada indivíduo possui pelo fato de pertencer à pluralidade de sujeitos a que se refere à norma em questão.”[10]


            Disso podemos extrair que a Constituição descreve a importância da preservação ambiental como essencial à proteção dos seres humanos, na medida em que um ambiente sadio é corolário do direito a uma vida digna.
            Cumpre salientar que a constitucionalização da preservação ao ambiente é o reflexo da importante e necessária positivação do tema, cuja essência busca-se pela fundamentação do meio ambiente como um direito fundamental.

3.2 DIVISÃO JURÍDICA DO DIREITO AMBIENTAL

            Com o fito de facilitar a identificação dos problemas e soluções ambientais, ainda que o direito ao ambiente seja único, grande parte dos doutrinadores o dividem em quatro temas principais, por pura questão metodológica, quais sejam: meio ambiente natural ou físico, meio ambiente artificial, meio ambiente cultural e meio ambiente do trabalho.
            O meio ambiente natural ou físico é definido no artigo 3º, inciso I, da Lei nº 6938/81, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio ambiente. Vejamos:

"Art 3º - Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por:
I - meio ambiente, o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas
(...)".[11]

            Ou seja, o artigo supracitado descreve o meio ambiente natural como sendo constituído pelos recursos naturais, como o solo, a água, o ar, a flora e a fauna.
            Por segundo, o meio ambiente artificial, que esbarra nas questões urbanas e rurais. Este diz respeito aos prédios, praças, espaços públicos e equipamentos comunitários que ocupam áreas dominadas pelo ser humano, que são alteradas por construções.
            Já o meio ambiente cultural é o patrimônio histórico, artístico, ecológico, científico e turístico. Pode tanto se tratar de bem materiais, como de bens imateriais, como a dança, idioma e cultura de um povo.
            Por fim, o meio ambiente ao trabalho, que é considerado uma extensão do meio ambiente artificial. Esta classificação relaciona o ambiente, as ferramentas, as condições e os processos envolvidos no trabalho de um indivíduo, com a finalidade de assegurar a todos uma condição digna de vida e a garantia da salubridade e da condição positiva física e psicológica a que são submetidos os empregados.
            Essa divisão jurídica no meio ambiente é interessante na medida em que nos mostra como o meio ambiente afeta a vida do indivíduo e da coletividade, pois está sempre presente em todas as atividades desenvolvidas pelos seres humanos, pelo que deve ter uma atenção especial do Estado e da sociedade para sua proteção.

3.3 ANÁLISE DA EXPRESSÃO "DIREITOS FUNDAMENTAIS" E SUAS DIMENSÕES

            A evolução da sociedade, dos movimentos sociais, políticos e econômicos estão ligados ao surgimento dos direitos fundamentais, acarretando na materialização e inclusão nos ordenamentos dos povos em geral, transformando os direitos fundamentais em conquistas garantidas aos seres humanos.
            Para uma melhor compreensão do assunto tratado, faz-se necessária uma explanação sobre os direitos fundamentais.
            Sobre o tema, o Professor Doutor José Joaquim Gomes Canotilho afirma que os direitos fundamentais são aqueles direitos intrinsecamente pertencentes ao homem e que se encontram jurídica e institucionalmente garantidos, limitados por espaço e tempo determinados. Bem como que os direitos fundamentais são direitos objetivamente vigentes em uma ordem jurídica concreta.[12]
             O doutrinador brasileiro Alexandre de Moraes conceitua os direitos fundamentais como:

O conjunto institucionalizado de direitos e garantias do ser humano que tem por finalidade básica o respeito a sua dignidade, por meio de sua proteção contra o arbítrio do poder estatal e o estabelecimento de condições mínimas de vida e desenvolvimento da personalidade humana”.[13]


            Nesse sentido, observa-se que os direitos fundamentais são pressupostos para a constituição da vida digna do homem.
            Para complementação da ideia, o jurista Paulo Bonavides afirma que “são objetivos primordiais dos direitos fundamentais criar e manter os pressupostos elementares de uma vida baseada na liberdade e na dignidade da pessoa humana."[14]
            Dessa forma, devidamente conceituada a terminologia dos direitos fundamentais, deve-se analisar as gerações desses direitos para a correta compreensão do enquadramento do direito do meio ambiente no rol dos direitos consagrados como fundamentais.
            Primeiramente, é importante salientar que as gerações dos direitos fundamentais não se sobrepõem, ou seja, elas não se substituem, tampouco são isoladas umas das outras.É por esse motivo que a denominação "dimensão" ao invés de "geração" seria mais adequada para evitar falsas interpretações.
            As dimensões dos direitos fundamentais refletem diferentes momentos históricos, havendo uma complementação desses direitos na medida em foram surgindo por influência da evolução da sociedade.
              Os direitos fundamentais de primeira dimensão são aqueles integrados pelos direitos civis e políticos. Dentre os direitos que fazem parte deste rol estão o direito à vida, à intimidade, à inviolabilidade de domicílio, à propriedade e à igualdade perante a lei.
            O doutrinador Paulo Bonavides explica:

“Os direitos da primeira geração são os direitos da liberdade, os primeiros a constarem do instrumento normativo constitucional, a saber, os direitos civis e políticos, que em grande parte correspondem, por um prisma histórico, àquela fase inaugural do constitucionalismo do Ocidente.
[...]
Os direitos de primeira geração ou os direitos de liberdade têm por titular o indivíduo, são oponíveis ao Estado, traduzem-se como faculdades ou atributos da pessoa que ostentam uma subjetividade que é seu traço mais característico; enfim, são direitos de resistência ou de oposição perante o Estado”.[15]


            Os direitos elencados como sendo de primeira dimensão reconhecem autonomia aos particulares e independência aos indivíduos diante do Estado. São os denominados "direitos individuais", também conhecidos como "liberdades civis".[16]
Esses direitos são considerados e valorizados como de resistência perante o Estado, sendo chamados por este motivo como direitos negativos, algo como “agir ou não agir, fazer ou não fazer. Usar ou não usar. Ir, vir ou ficar”.[17]
        Os direitos fundamentais de segunda geração aparecem com o modelo de Estado Social de Direito,que surgiu logo após o encerramento da Primeira Guerra Mundial, em decorrência da observação da degradação da vida humana no conflito.
            Esse rol de direitos reclama do Estado ações que propiciem as mínimas condições de dignidade à pessoa humana. Daí surgem os direitos sociais, econômicos e culturais, com a clara intenção de diminuir a desigualdade social e ampliar a proteção aos desfavorecidos.
         O que distingue os direitos fundamentais de segunda geração dos direitos da dimensão anterior é seu caráter positivo, pois deixa de ter como foco principal evitar a intervenção do Estado na esfera liberal individual para a preocupação de propiciar o bem-estar social.
            É o que ensina o Professor Doutror Pietro Alarcón:

“A partir da terceira década do século XX, os Estados antes liberais começaram o processo de consagração dos direitos sociais ou direitos de segunda geração, que traduzem, sem dúvida, uma franca evolução na proteção da dignidade humana. Destarte, o homem, liberto do jugo do Poder Público, reclama uma nova forma de proteção da sua dignidade, como seja, a satisfação das carências mínimas, imprescindíveis, o que outorgará sentido à sua vida".[18]


            Isto posto, os direitos acima referidos estão anexos à direitos sociais que o Estado deve prestar ao indivíduo, como educação, saúde, cultura, trabalho, lazer, assistência social, entre outros.
            A proteção internacional dos direitos humanos voltada mais especificamente para a essência do ser humano e para o destino da humanidade surgiu logo após a Segunda Guerra Mundial, com a criação de entidades como a Organização das Nações Unidas. O pensamento em relação ao ser humano passou a ser não mais adstrito ao indivíduo ou à uma coletividade determinada, mas sim como gênero. [19] Foi então que começaram a aparecer os direitos chamados de terceira dimensão, entre eles o direito ao desenvolvimento, à paz, à comunicação, ao meio-ambiente, à conservação do patrimônio histórico e cultural da humanidade, entre outros.
           Por estarem voltados à humanidade como um todo, são considerados direitos coletivos por excelência. Nesse sentido,o professor Paulo Bonavides conceitua:

“Dotados de altíssimo teor de humanismo e universalidade, os direitos da terceira geração tendem a cristalizar-se neste fim de século enquanto direitos que não se destinam especificamente à proteção dos interesses de um indivíduo, de um grupo, ou de um determinado Estado. Têm primeiro por destinatário o gênero humano mesmo, num momento expressivo de sua afirmação como valor supremo em termos de existencialidade concreta. Os publicistas e juristas já o enumeram com familiaridade, assinalando-lhe o caráter fascinante de coroamento de uma evolução de trezentos anos na esteira da concretização dos direitos fundamentais. Emergiram eles da reflexão sobre temas referentes ao desenvolvimento, à paz, ao meio ambiente, à comunicação e ao patrimônio comum da humanidade”[20]

            Pela característica de valorização de um ambiente equilibrado, da qualidade de vida, paz, progresso e autodeterminação, os direitos de terceira geração são também conhecidos como "direitos de solidariedade e fraternidade". Como se vê nos ensinamentos de Luiz Alberto Araújo e Vidal Serrano Neves Júnior:

 “A essência desses direitos se encontra em sentimentos como a solidariedade e a fraternidade, constituindo mais uma conquista da humanidade no sentido de ampliar os horizontes de proteção e emancipação dos cidadãos”.
(...)
Enfoca-se o ser humano relacional, em conjunção com o próximo, sem fronteiras físicas ou econômicas.”[21]


            Tendo em vista que os direitos desta dimensão são voltados à proteção do homem, sendo estes direitos transindividuais, o direito à vida passa a ser visto como um direito possível de ser lesado. É da preocupação em proteger o direito à vida que emana a necessidade de proteção ao meio ambiente, uma vez que para se assegurar uma vida digna aos seres humanos é preciso um ambiente sadio para se viver.
            Assim, após a Declaração de Estocolmo, passou-se a considerar o direito ao ambiente digno e sadio como um direito fundamental de terceira geração, que não pode ser violado.
                        Sobre este importante tema, o Professor Doutor Ingo Sarlet leciona:

"A nota distintiva destes direitos de terceira geração reside basicamente na sua titularidade coletiva, muitas vezes indefinida e indeterminável, o que se revela, a título de exemplo, especialmente no direito ao meio ambiente e qualidade de vida, o qual, em que pese ficar preservada sua dimensão individual, reclama novas técnicas de garantia e proteção. A atribuição da titularidade de direitos fundamentais ao próprio Estado e à Nação (direito à autodeterminação, paz e desenvolvimento) tem suscitado sérias dúvidas no que concerne à própria qualificação de grande parte destas reivindicações como autênticos direitos fundamentais."[22]


            Sendo os direitos de terceira geração de natureza coletiva, indeterminável ou indefinida, tendo como foco principal a proteção do homem, sua eficácia está intimamente ligada à participação da sociedade e dos Estados em nível internacional.
            Além das três dimensões citadas acima, uma parte dos doutrinadores discorre sobre a existência dos direitos de quarta dimensão. Dentre os defensores desta corrente,Paulo Bonavides afirma que "os direitos de quarta geração compreenderiam o futuro da cidadania e o porvir da liberdade de todos os povos. Tão somente com eles será legítima e possível a globalização política”.[23]
            O direito à democracia, à informação e ao pluralismo são defendidos por esta dimensão, que procura torná-los efetivos através da igualdade e fraternidade. Seriam incluídos neste rol os chamados "novos direitos", que são de natureza complexa, polêmica e interdisciplinar, quais sejam a bioética, a engenharia genética, a biotecnologia, ou seja, temas que se relacionam à polêmicas como clonagem e eutanásia. [24]
            Ainda, há quem defenda os direitos de quinta geração, que, nas palavras do doutrinador Oliveira Júnior"nascem do grande desenvolvimento da cibernética na atualidade, implicando no rompimento de fronteiras tradicionais, estabelecendo conflitos entre países com realidades distintas, via internet, por exemplo”. [25]
            Em suma, pode-se constatar que os vários momentos históricos pelos quais passa a humanidade gera novos problemas que precisam ser solucionados através de novas normas, de forma a garantir a proteção dos direitos do homem.
            Entre as preocupações já reconhecidas pelo direito está o meio ambiente, positivado nos direitos de terceira geração, e que até hoje se mostra um desafio.

3.4 O MEIO AMBIENTE COMO DIREITO FUNDAMENTAL DE TERCEIRA DIMENSÃO

            Como já citado anteriormente, o início da preocupação dos Estados com a proteção ao ambiente surgiu após a Declaração de Estocolmo, ocorrida em 1972, durante a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano.
            Nesta Declaração pioneira, onde foram elaborados 26 princípios, encontramos:

“Princípio1 - O homem tem direito fundamental à liberdade, à igualdade e condições de vida adequadas, em um meio ambiente de qualidade tal que lhe permita levar uma vida digna, gozar de bem-estar e é portador solene de obrigação de proteger e melhorar o meio ambiente, para as gerações presentes e futuras.
Princípio 2 - Os recursos naturais da Terra, incluídos o ar, a água, o solo, a flora e a fauna e, especialmente, parcelas representativas dos ecossistemas naturais, devem ser preservados em benefício das gerações atuais e futuras, mediante um cuidadoso planejamento ou administração adequada.”[26]

            Assim, o meio ambiente foi então consagrado como um direito fundamental do ser humano. Este foi o marco para, a partir deste momento, começarem a surgir dispositivos no intuito de garantir a proteção a um ambiente sadio e equilibrado, de forma a manter elevada a qualidade de vida dos seres humanos.
            Para que se possa garantir um meio ambiente ecologicamente equilibrado, é necessária a efetividade dos demais direitos fundamentais elencados na Constituição, uma vez que não se pode conceber uma vida digna sem saúde, bem estar, lazer e qualidade de vida. Nessa medida, aparece então o compromisso do Estado em instituir políticas públicas necessárias e eficazes para tornar realidade o ambiente saudável, bem como a cooperação da sociedade na conscientização da ética ambiental.
            É este o entendimento da Professora Doutora Fernanda Luiza Fontoura Medeiros:
           
"A relação entre os direitos humanos e a proteção ao meio ambiente adotou diversas formas quando se pode perceber que a deterioração ambiental poderia impedir o gozo de direitos já reconhecidos como fundamentais ao ser humano, desde os casos mais extremos do direito à vida, à saúde, aos direitos culturais e de patrimônio histórico. (...)
A consciência desta interação entre os direitos humanos e o direito ao meio ambiente tem contribuído decisivamente com a evolução da internacionalização, com a globalização da proteção de ambos os direitos referendados. Não há, com efeito, como se pretender salvaguardar o direito humano à vida, sem proteger o meio em que esta vida se desenvolve."[27]


            O direito ao ambiente consagrado na Constituição Brasileira está elencado como de tríplice dimensão, ou seja, tem caráter individual, social e intergeracional.
            Individual, pois a qualidade de vida que busca se alcançar é considerada em sua individualidade, ou seja, interessa a cada ser humano possuir uma vida sadia em um meio ambiente equilibrado.
            Social porque o direito ao meio ambiente é de interesse difuso, uma vez que faz parte do patrimônio coletivo e, ainda que possua caráter individual, não há como um indivíduo se apropriar do meio ambiente para seu próprio consumo.
            Intergeracional, uma vez que a defesa do ambiente hoje irá refletir no mundo das gerações futuras.
            Ensina o Professor Doutor José Joaquim Gomes Canotilho que o meio ambiente equilibrado é compreendido tanto pela perspectiva subjetiva quanto pela objetiva. A primeira diz respeito à relevância das normas idealizadoras de direitos fundamentais na vida do ser humano e a importância destas na esfera privada e na satisfação de interesses pessoais. Já a esfera objetiva está ligada aos valores da norma que emanam da coletividade, com a natureza de interesse público, tratando-se de uma fundamentação objetiva de norma consagradora da vivência comunitária.[28]
            Diante disso, podemos observar que a dimensão coletiva do direito ao ambiente, eis que é direito fundamental de terceira geração, não afasta a dimensão individual garantida aos seres humanos. No entanto, deve sempre prevalecer o interesse comum.
            Contudo, a grande dificuldade encontrada no que diz respeito à preservação ao ambiente está justamente na seara coletiva, o que requer o interesse do Estado em estar pronto quando for necessário intervir, uma vez que cabe a ele zelar pelo direito da coletividade, do indivíduo e do próprio Estado, através de seu poder de defesa ao ambiente constante na Constituição.
            Além dos direitos fundamentais, devemos lembrar também da existência dos deveres fundamentais. Respeitar o meio ambiente e garantir-lhe uma tutela eficaz são deveres fundamentais não autônomos, ou seja, estão positivados na Constituição Brasileira e conexos ao direito fundamental ao meio ambiente equilibrado.
Através dos deveres fundamentais, é possível até mesmo garantir a tutela do Estado em relação às plantas e animais, mesmo estes sendo desprovidos de personalidade jurídica, ou seja, há determinados destinatários que não possuem a titularidade do direito ao ambiente, porém ainda assim carecem e têm proteção ambiental.[29]
            Nesse sentido, se pronuncia Habermas:

"(...) um reconhecimento recíproco de sujeitos, ao menos potencialmente livres e iguais, constitui uma necessidade conceitual e determina o status dos deveres frente aos animais assimetricamente [instituídos]; os animais não têm direito frente aos homens, mas os homens têm deveres frente aos animais."[30]


            Dessa forma, nítido é o dever fundamental de proteção ao ambiente em favor não só da humanidade, como também em face daqueles que não possuem personalidade jurídica e, em regra, não teriam a proteção garantida. Desta feita, podemos afirmar que todas as ações e defesas relacionadas ao meio ambiente devem ser elaboradas por todo o globo, e não apenas por determinados Estados, uma vez que devem atingir todos os povos.
            Um exemplo atual disto é a poluição atmosférica, que afeta a todos e necessita da tutela global pelo meio dos deveres, e não dos direitos, eis que é através do dever que se obtém a força para obrigar os indivíduos a criarem medidas de proteção.
           
3.5 EFEITOS JURÍDICOS DO DIREITO AO AMBIENTE

            O direito a um meio ambiente equilibrado carrega consigo as seguintes características: imprescritibilidade, inalienabilidade, irrenunciabilidade, caracterização como cláusula pétrea e interpretação mais favorável em caso de conflitos de normas.
            A imprescritibilidade se traduz à não limitação de tempo do exercício do direito de proteção ao ambiente, sendo que pode-se acessá-lo judicialmente a qualquer momento. Tal fato se dá pela natureza indisponível dos direitos fundamentais.
            A inalienabilidade do direito ao ambiente se dá por sua característica de titularidade difusa, ou seja, pertence tanto ao indivíduo quanto à coletividade. Não se pode alienar algo garantido a toda a humanidade, pois trata-se de um direito indisponível.
            Em terceiro, está a irrenunciabilidade. O titular de um direito fundamental não pode renunciá-lo, no entanto, lhe é cabível não usufruir do direito que possui.
            Os direitos e garantias individuais protegidos pelo texto constitucional brasileiro em seu artigo 60, §4º não podem sofrer mudanças legislativas que tenham como objetivo os diminuir ou abolir. São as chamadas cláusulas pétreas. Estando o direito ao ambiente inserido no rol dos direitos fundamentais, este está sob o abrigo da cláusula pétrea. Sendo o direito ambiental tratado desta maneira, é possível garantir um meio ambiente sadio e equilibrado para as futuras gerações.
            O direito ao ambiente se encontra no topo da escala hierárquica dos direitos, uma vez que está inserido como um direito fundamental. Em razão disso, na eventual necessidade de aplicação de normas que sejam conflitantes, este terá primazia em relação às demais.
            Ressalte-se que, no caso de haver colisão de dois bens distintos, de natureza fundamental, cabe ao intérprete e aplicador da norma fazer a devida ponderação entre eles, através do sacrifício mínimo dos direitos em jogo, com base nos princípios da unidade da Constituição, da concordância prática e da proporcionalidade, dentre outros.[31]
            Portanto, ao ser trazido para o rol dos direitos fundamentais, o direito ao ambiente passa a ter grande relevância para o ordenamento jurídico brasileiro. Importância esta que se infere das marcantes características de ser um direito imprescritível, inalienável, irrenunciável, irrevogável e preferencial, sinalizando a evolução do pensamento em relação ao meio ambiente.

4 DIREITO AO AMBIENTE X DIREITO AO DESENVOLVIMENTO

            Uma das principais discussões relativas ao tema diz respeito ao desenvolvimento econômico e a proteção ao meio ambiente.
            Muitos acreditam se tratar de direitos antagônicos, que não são possíveis de conciliar. No entanto, muitos doutrinadores acreditam que a junção equilibrada destes dois direitos pode ser realizada.
            O direito ao desenvolvimento é, assim como o direito ao ambiente, um direito fundamental de terceira dimensão, devidamente protegido pelo texto constitucional. Ainda, os dois aparecem dispostos na Lei 6.938/81 de forma a harmonizar a existência de ambos:

"Art. 2º. A Política Nacional do Meio Ambiente tem por objetivo a preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando assegurar, no País, condições ao desenvolvimento sócio-econômico, aos interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade da vida humana."
           
"Art. 4º. A Política Nacional do Meio Ambiente visará:
I- a compatibilização do desenvolvimento econômico-social com a preservação da qualidade do meio ambiente e do equilíbrio ecológico."[32]


            Pelo que se depreende do texto transcrito, a vivência em um meio sadio e equilibrado é essencial para garantir uma vida digna aos seres humanos, com a qualidade de vida a que necessitam e, consequentemente, o impulso para o desenvolvimento. É a partir da junção da proteção ao meio ambiente e do direito ao desenvolvimento que surge o conceito de desenvolvimento sustentável, muito em voga atualmente.
            A primeira aparição desta denominação foi apresentada no Relatório Bruntland, em 1987. O documento foi elaborado pela Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento e apresentou uma visão inovadora sobre o tema, ao definir que este deve satisfazer as necessidades presentes, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias necessidades”.[33]
            O Relatório mostra que não é necessária a estagnação do desenvolvimento econômico, desde que haja conciliação com as questões ambientais e sociais.
            Para tal, é de fundamental importância que os Estados incluam em seus projetos de desenvolvimento estudos sobre o impacto ambiental nos locais onde pretendem intervir.
            É imperativa a necessidade da concordância prática entre os direitos fundamentais de desenvolvimento e do ambiente, com a finalidade de se aproveitar ao máximo os benefícios de ambos, sem sacrificar o conteúdo que carregam.[34]
            A respeito do tema, o Supremo Tribunal Federal se manifestou:

"Meio ambiente - direito à preservação de sua integridade (CF, art. 225) - prerrogativa qualificada por seu caráter de metaindividualidade - direito de terceira geração (ou de novíssima dimensão) que consagra o postulado da solidariedade - necessidade de impedir que a transgressão a esse direito faça irromper, no seio da coletividade, conflitos intergeneracionais - espaços territoriais especialmente protegidos (CF, art. 225, § 1º, III) - alteração e supressão do regime jurídico a eles pertinente - medidas sujeitas ao princípio constitucional da reserva de lei - supressão de vegetação em área de preservação permanente - possibilidade de a Administração Pública de, cumpridas as exigências legais, autorizar, licenciar ou permitir obras e/ou atividades nos espaços territoriais protegidos, desde que respeitada, quanto a estes, a integridade dos atributos justificadores do regime de proteção especial - relações entre economia (CF, art. 3º, ii, c/c o art. 170, vi) e ecologia (cf, art. 225) - colisão de direitos fundamentais - critérios de superação desse estado de tensão entre valores constitucionais relevantes - os direitos básicos da pessoa humana e as sucessivas gerações (fases ou dimensões) de direitos (RTJ 164/158, 160-161) - a questão da precedência do direito à preservação do meio ambiente: uma limitação constitucional explícita à atividade econômica (CF, art. 170, VI) - decisão não referendada - conseqüente indeferimento do pedido de medida cautelar. A preservação da integridade do meio ambiente: expressão constitucional de um direito fundamental que assiste à generalidade das pessoas. - Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Trata-se de um típico direito de terceira geração (ou de novíssima dimensão), que assiste a todo o gênero humano (RTJ 158/205-206). Incumbe, ao Estado e à própria coletividade, a especial obrigação de defender e preservar, em benefício das presentes e futuras gerações, esse direito de titularidade coletiva e de caráter transindividual (RTJ 164/158-161). O adimplemento desse encargo, que é irrenunciável, representa a garantia de que não se instaurarão, no seio da coletividade, os graves conflitos intergeneracionais marcados pelo desrespeito ao dever de solidariedade, que a todos se impõe, na proteção desse bem essencial de uso comum das pessoas em geral. Doutrina. A atividade econômica não pode ser exercida em desarmonia com os princípios destinados a tornar efetiva a proteção ao meio ambiente. - A incolumidade do meio ambiente não pode ser comprometida por interesses empresariais nem ficar dependente de motivações de índole meramente econômica, ainda mais se se tiver presente que a atividade econômica, considerada a disciplina constitucional que a rege, está subordinada, dentre outros princípios gerais, àquele que privilegia a "defesa do meio ambiente" (CF, art. 170, VI), que traduz conceito amplo e abrangente das noções de meio ambiente natural, de meio ambiente cultural, de meio ambiente artificial (espaço urbano) e de meio ambiente laboral. Doutrina. Os instrumentos jurídicos de caráter legal e de natureza constitucional objetivam viabilizar a tutela efetiva do meio ambiente, para que não se alterem as propriedades e os atributos que lhe são inerentes, o que provocaria inaceitável comprometimento da saúde, segurança, cultura, trabalho e bem-estar da população, além de causar graves danos ecológicos ao patrimônio ambiental, considerado este em seu aspecto físico ou natural. A questão do desenvolvimento nacional (cf, art. 3º, ii) e a necessidade de preservação da integridade do meio ambiente (cf, art. 225): o princípio do desenvolvimento sustentável como fator de obtenção do justo equilíbrio entre as exigências da economia e as da ecologia. - O princípio do desenvolvimento sustentável, além de impregnado de caráter eminentemente constitucional, encontra suporte legitimador em compromissos internacionais assumidos pelo Estado brasileiro e representa fator de obtenção do justo equilíbrio entre as exigências da economia e as da ecologia, subordinada, no entanto, a invocação desse postulado, quando ocorrente situação de conflito entre valores constitucionais relevantes, a uma condição inafastável, cuja observância não comprometa nem esvazie o conteúdo essencial de um dos mais significativos direitos fundamentais: o direito à preservação do meio ambiente, que traduz bem de uso comum da generalidade das pessoas, a ser resguardado em favor das presentes e futuras gerações."[35]


            Observa-se que, na decisão da Corte Suprema brasileira, os magistrados aplicaram justamente este conceito de desenvolvimento sustentável, visando conciliar o direito ao ambiente com o direito ao desenvolvimento. Ainda, o julgado chama a atenção para o fato de que ambos direitos são compatíveis, devendo ser aplicados conjuntamente para preservar outros direitos dos cidadãos.
            A harmonização desses direitos é uma tendência mundial, sendo que o desenvolvimento sustentável vem sendo buscado cada vez mais pelos Estados, conscientes de sua importância e necessidade.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

            Considerar o direito ao ambiente como sendo um direito fundamental foi um grande passo para a humanidade no que se refere à preservação   dos recursos naturais, da qualidade de vida e do equilíbrio da vida na Terra.
            No entanto, a proteção ao ambiente, ainda que tutelada em vários dispositivos na legislação brasileira, precisa sobremaneira da atenção especial do Estado. Por mais que normas protetivas existam, muitas vezes não se consegue uma efetiva aplicação destas, e a crise ambiental global é reflexo disso.
            Apenas a positivação do direito ao ambiente, sem uma efetiva aplicação e fiscalização do cumprimento das normas se configura como uma medida meramente paliativa, o que acaba por agravar ainda mais a crise.
            Felizmente há uma crescente conscientização mundial no que se refere à proteção ao meio ambiente, gerando inúmeros debates acerca do assunto. Em meio a essas discussões, surge talvez o mais importante conceito ambiental, que pode vir a ser a chave para o sucesso desta cruzada global: o desenvolvimento sustentável.
            Ao conseguir aliar a proteção do meio em que vivemos com o desenvolvimento da humanidade, harmonizando ambos, é possível amenizar a crise que enfrentamos e, quem sabe, reverter o quadro para legar mais esperança às gerações futuras.



[1] CRETELLA JUNIOR, José, Comentários à Constituição 1988, Vol. VIII Ed. Forense Universitária, 2ª Ed, p. 4517.
[2] AMOY, Rodrigo de Almeida. A proteção do direito fundamental ao meio ambiente no direito interno e internacional. Disponível em:
<http://www.conpedi.org.br/manaus/arquivos/anais/bh/rodrigo_de_almeida_amoy.pdf>. Acesso em: 06 mai. 2013.
[3] ANGELIN, Rosângela. A crise ambiental e a insuficiência das legislações. Disponível em:
<http://www.arede.org.br/index.php?option=com_content&view=article&id=79:-a-crise-ambiental-e-a-insuficiencia-das-legislacoes&catid=48:agroecologia&Ite mid=28>. Acesso em: 03 mai. 2013.
[4] MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 11. ed. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 65.
[5] FARIAS, Talden Queiroz. O conceito  jurídico de meio ambiente. Âmbito Jurídico. Disponível em:<http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=1546>.  Acesso em: 05 mai. 2013.
[6] BRASIL. Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6938.htm>. Acesso em 06 mai. 2013.
[7] FIORILLO, Celso A. P., Curso de Direito Ambiental Brasileiro, 12. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2011.
[8] BRASIL. Constituição (1988).
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em 06 mai. 2013.
[9]O conceito legal de interesses ou direitos difusos encontra-se no artigo 81, parágrafo único, inciso I do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/1990).
[10] ABELHA, Marcelo. Ação Civil Pública e Meio Ambiente. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004.
[11]  BRASIL. Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6938.htm>. Acesso em 06 mai. 2013.
[12] CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 1998. p. 359.
[13] MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais: Teoria Geral. 4ªed. São Paulo: Atlas, 2002.
[14] BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. São Paulo: Malheiros, 2000. p. 472.
[15]BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 18. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 563-564.
[16]SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 20. ed. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 182-183.
[17]ARAUJO, Luiz Alberto David; NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano. Curso de Direito Constitucional. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 116
[18]ALARCÓN, Pietro de Jésus Lora. O patrimônio genético humano e sua proteção na Constituição Federal de 1988. São Paulo: Método, 2004, p. 79.
[19]ARAUJO, Luiz Alberto David; NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano. Curso de Direito Constitucional. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 116
[20]BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 18. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 563-569.
[21]ARAUJO, Luiz Alberto David; NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano. Curso de Direito Constitucional. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 116.
[22]SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1998. p. 54.
[23]BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. São Paulo: Malheiros, 2000. p.524-525.
[24] RITT, Leila Eliana Hoffmann. O desenvolvimento sustentável e o meio ambiente como forma de concretização dos direitos fundamentais de terceira dimensão. Disponível em: <http://sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/071206652.pdf>. Acessado em: 05 mai. 2013.
[25] OLIVEIRA JUNIOR, Jose Alcebiades. Teoria jurídica e novos direitos. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2000. p. 105. v. 1
[26] DECLARAÇÃO DE ESTOCOLMO. Disponível em:  <http://www.silex.com.br/leis/normas/estocolmo.htm>. Acesso em: 05 mai. 2013.
[27] MEDEIROS, Fernanda Luiza Fontoura. Meio ambiente: direito e dever fundamental. Porto Alegre:Livraria do Advogado, 2004. p. 32.
[28] CANOTILHO, Jose Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da Constituição. Lisboa: Amedina, 2000. p. 1178
[29] REITZ, Rebeca Monteiro. Meio ambiente: instrumentos judiciais coletivos de proteção. 179f. Dissertação (Mestrado) - Universidade da Amazônia, Belém, 2008.
[30] HABERMAS, Jüngen. Aclariaciones a la ética del discurso. Madrid: Editorial Trotta, 1999. p. 73.
[31]FARIAS, Edilsom Pereira de. Colisão de direitos: a honra, a intimidade, a vida privada e a imagem versus a liberdade de expressão e informação. 2. ed. atual. Porto Alegre: Fabris, 2000. p. 53.
[32] BRASIL. Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6938.htm>. Acesso em 06 mai. 2013.
[33] MUDANÇAS CLIMÁTICAS. Relatório Brundtland e a sustentabilidade. Disponível em: <http://www.mudancasclimaticas.andi.org.br/node/91>. Acesso em: 06 mai. 2013.
[34] BARCELLOS, Ana Paula de. Ponderação, racionalidade e atividade jurisdicional. Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p. 133-139.
[35] BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade
n. 3.540/DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, j. 01.09.2005. Disponível em: www.stf.gov.br.
Acesso em: 06.05.2013.


                                                                                                                         Camila Simão
                                                                                           Nº 23912
                                                                                           Subturma 3


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