No seguimento de anteriores posts
publicados, achei interessante abordar um artigo da Revista Courrier Internacional que tive recentemente oportunidade
de ler, cuja edição remonta a Março do presente ano (2013) sobre “A ameaça oculta dos smartphones”.
Este artigo é retratado na primeira pessoa por um jornalista
de investigação cujo nome não é revelado mas que, através do seu estudo, nos
transmite a verdadeira realidade por de trás da tecnologia.
O autor inicia
a sua exposição fazendo referência a uma conversa informal com um talhante residente
em Bukit Merah (Malásia), que em 1980 era dono de um empresa de
transportes. Este talhante, de nome Hew
Yun Tat, trabalhava para a Asian Rare Earth (uma fábrica local,
copropriedade do grupo Japonês Mitsubishi Chemical), que fornecia
metais raros para o sector da electrónica de grande consumo. O trabalho
consistia apenas em desfazer-se dos detritos da fábrica. Sem conhecer a
verdadeira realidade, Hew Yun Tat acreditava quando os proprietários da mesma
lhe diziam que os detritos eram apenas fertilizantes, os quais inocentemente depositava
em herdades.
“Como o meu tio cultiva legumes,
também costuma deixar uma parte na quinta dele”, diz Hew Yun Tat. Acrescenta ainda que os funcionários da refinaria
ofereciam aos transportadores uma mistela, que diziam ser cal viva. Um dos
motoristas até a usou para pintar a casa…!
Na realidade, o que Hew Yun Tat e os seus empregados
transportavam eram detritos tóxicos e radioactivos, o que só descobriram um ano
mais tarde quando a Asian Rare Earth começou a construir um aterro numa cidade
vizinha. Os habitantes opuseram-se tendo alguns levado um contador Geiger.
Detetaram níveis de radioactividade 88
vezes superiores aos máximos internacionais.
Em 1985, os habitantes interpuseram uma acção judicial que forçou o
Governo a encerrar a fábrica até a Asian Rare Earth limpar o terreno.
Tinham ainda começado a haver muitos abortos entre mulheres da vizinhança bem
como frequentes casos de recém-nascidos cegos, com perturbações mentais ou
sofrendo de leucemia. Neste seguimento, a administração pública informou os
residentes que os detritos eram sujeitos a tratamento, muito embora não se
consiga perceber em que medida porque em 2010,
repórteres de um jornal local encontraram no aterro da Asian Rare Earth 80
mil bidões com 16 mil litros de hidróxido de tório (um composto
radioactivo).
O autor do
artigo em análise refere que foi o seu Iphone que o levou à Malásia, por ter
lido artigos sobre fábricas da Apple na China onde adolescentes passavam horas
por dia a limpar ecrãs com solventes tóxicos, descobrindo assim que o “lado
negro” dos smartphones começava muito antes da sua montagem. Os materiais
utilizados na produção deste tipo de equipamento provêm de recursos preciosos
extraídos de Estados pobres, deixando a cargo dos mesmos a conta da limpeza.
Em 2008, o Governo da Malásia
autorizou uma empresa australiana (a Lynas Corporation) a abrir uma
fábrica de processamento de terras raras na costa leste do país. A extracção do
minério será feita na Austrália mas o tratamento e refinação será feito em
Kuantan (Malásia). Esta fábrica será a maior do seu ramo, abastecendo 20% do
mercado mundial de terras raras, o que para o Governo da Malásia representa uma
oportunidade para chegar ao primeiro plano de uma das indústrias mais
lucrativas. Cerca 20 anos depois do encerramento da fábrica de Bukit Merah, a
procura de terras raras duplicou. De facto, este sector representa actualmente
7,4 milhões de euros e prevê-se que a procura aumente 36% até 2015. Graças a
estes metais raros (terras raras), conseguem-se fabricar circuitos electrónicos
com um desempenho até há pouco impensável.
Por exemplo, o ítrio (que constitui um desses metais raros) é a base de um
conjunto de compostos que permite aos ecrãs LCD emitir luz.
A questão central
de toda a temática em análise gera em torno do facto de estes metais aparecem
associados na natureza a elementos radioactivos como o urânio ou tório e
separá-los com segurança requer um processamento complexo. Este processo
consume quantidades abismais de água e energia (correspondendo,
respectivamente, à água necessária para encher três piscinas olímpicas e à
energia para iluminar 50 mil residências). O líquido final é fervido para
separar os metais dos elementos radioactivos e é neste procedimento que surgem
os problemas: os depósitos destes compostos têm de estar bem isolados, caso
contrário correr-se-á o risco de infiltrações nos lenções freáticos. O autor
refere ainda que estes materiais têm de ficar armazenados para sempre dado que
o tempo que levam a perder
radioactividade é de 14 mil milhões de anos para o tório e 4,5 mil milhões para o urânio. Ora, o
planeta Terra existe há 4,5 mil milhões
de anos, sendo todo este o tempo para que um elemento como o urânio se
torne inofensivo. Considera ainda não ser por acaso que as instalações destas
fábricas se encontram em regiões cujas
normas ambientais são praticamente inexistentes.
Conclui o
artigo referindo que “ tudo isto para que eu e os meus amigos possamos
conversar sobre a ordem de aparição dos três primeiros álbuns dos Metallica sem
sair do sofá”.
Retirado
de:
· - Courrier Internacional; Nº205, Março de 2013;
Imprensa Publishing.
Mónica Lopes
Nº16794
Subturma 3
Sem comentários:
Enviar um comentário