sábado, 18 de maio de 2013

O Direito do Ambiente e a integração do conceito de "animal"


I. Introdução

            O Direito do Ambiente é um dos ramos mais recentes do Direito. Nasceu como um “Direito contra”, mas tem crescido como um direito de reconciliação entre o Homem e o meio, numa tentativa de sustar a degradação do estado dos recursos sem com isso pôr em causa o modelo de desenvolvimento sócio-económico que sustenta a civilização ocidental.
            Ao nível da pré-compreensão do Direito do Ambiente, existe uma opção entre uma perspectiva essencialmente antropocêntrica, em que a defesa do ambiente é feita com um objectivo principal, ou mesmo único, de defender a vida humana ou uma perspectiva ecocêntrica, em que o ambiente já é tutelado em si mesmo, procurando-se a defesa e promoção da natureza como um valor novo.
            A tutela do ambiente não poderá nunca ser concebida de forma absoluta, mas apenas em termos relativos, segundo níveis de “tolerabilidade”. Existem portanto duas grandes alternativas:

a)     a de optar por um conceito amplo de ambiente, em que se incluem os componentes ambientais naturais e os componentes ambientais humanos, ou seja, não está em causa somente o ambiente “natural” mas também o “constituído”.
b)    ou a de optar por um conceito estrito de ambiente, que se centra somente nos componentes ambientais naturais.

            Tendo em conta as alternativas acima, introduzo o conceito de “animal”. A noção de componentes ambientais está consagrada na Lei de Bases do Ambiente, nomeadamente nos seus artigos 6.º e 17.º (correspondendo o primeiro aos naturais e o segundo aos humanos). Os animais estão integrados no conceito de “fauna”, do artigo 6.º, alínea f), da Lei de Bases acima referida. Sendo assim, independentemente da alternativa escolhida, os animais serão sempre tidos em conta, pois classificam-se como componentes ambientais naturais.
            A questão que se nos coloca e que será analisada é a sujeição da categoria animal a um tratamento semelhante aos restantes componentes ambientais naturais. Deverá ser assim visto o regime ou deverão os animais ser sujeitos a uma tutela diferente. 

II. Breve evolução histórico-jurídica

            O despertar da era ecológica da comunidade internacional deu-se nos finais de 1960. Desde então, a multiplicação de instrumentos de protecção do ambiente deu origem a uma rede normativa complexa e de árdua concatenação, na qual se sobrepõe convenções de aplicação mundial e convenções de vocação regional, com proliferação de regimes e sistemas de resolução de conflitos. A tutela ambiental afirma-se como um desígnio internacional, fortemente dependente da cooperação entre os Estados e reflexo de novos valores de solidariedade, inter e intrageracional.
            Os ordenamentos nacionais foram assimilando a necessidade de protecção ambiental e inserindo no seu tecido legislativo normas e sistemas de tutela dos bens naturais a partir de finais da década de 60.
            Portugal, aproveitando a onda revolucionária, incorporou a tarefa de protecção do ambiente no texto constitucional, acolhendo na Constituição da República Portuguesa de 1976 (CRP) um artigo no âmbito da protecção do ambiente (o artigo 66.º), o qual, desde a revisão de 1982, vêm acompanhado da reserva de competência legislativa relativa da Assembleia da República, ao nível do estabelecimento das bases de protecção da Natureza (artigo 165.º, n.º 1, alínea g) da CRP). Existe também a norma que lhe confere a titulação formal de tarefa fundamental do artigo 9.º, alínea e).
            No entanto, o entusiasmo constitucional demorou algum tempo a contagiar o legislador ordinário e foram necessários onze anos para a elaboração das Bases da protecção do Ambiente. Houve, no entanto, uma certa indefinição do objecto da protecção. Deu-se um alargamento do artigo 66.º, n.º 2 da CRP, com a revisão constitucional de 1997. Assim criou-se uma noção amplíssima de ambiente, incluindo-se o património cultural, natural e construído, o ordenamento de território, o urbanismo, entre outros.
            Ao nível da tutela dos animais, a mais antiga referencia remonta ao Projecto da Comissão do Código Penal Português, designado por esta Comissão como o Código Penal de D. Pedro V, em finais de 1861. Os artigos 323.º, 324.º e 325.º preveem a “destruição, por qualquer modo, de animal doméstico”, punida com pena de prisão e de consideram como agravantes da pena as circunstâncias, não cumulativas, de o facto ter sido praticado em propriedade do dono do animal.
            No entanto, a primeira lei situa-se no início do século XX, no ano de 1919, com o Decreto n.º 5650, de 10 de Maio, em que era punível “toda a violência exercida sobre animais”. Estabelece ainda legitimidade processual das associações protectoras dos animais para estarem em juízo nos processos decorrentes da aplicação desta lei.
            No mesmo ano referido relativamente ao Decreto anterior, foi aprovado o Decreto n.º 5864, de 12 de Junho, que vem regulamentar o decreto anterior, especificando os actos considerados violentos e definindo a competência da promoção do procedimento criminal a cargo do Ministério Público. Era considerado portanto um crime público, cujo procedimento criminal não depende de queixa.
            No ano de 1928, o Decreto n.º 15 982, de 21 de Agosto, proibiu o uso de aguilhão ou de qualquer instrumento perfurante na condução de animais, que em transporte, quer em trabalho. Após esse Decreto, apenas 57 anos depois, em 1985, se verificou nova legislação que visava a matéria.
            O Decreto-Lei n.º 317/85, de 2 de Agosto, surgiu no âmbito do Programa Nacional de Luta e Vigilância Epidemiológica da Raiva Animal. Havia uma necessidade intrínseca de controlo da zoonose, comummente designada por “raiva animal”.  Existia um objectivo final de protecção da saúde da população.
            Em 1987 é aberta à assinatura dos Estados membros do Conselho da Europa, a Convenção Europeia para a Protecção dos Animais de Companhia, em que se estabelecem os princípios fundamentais para o bem-estar dos animais, as medidas complementares relativas aos animais vadios e a necessidade de desenvolvimento de programas de educação e de informação acerca das disposições desta mesma convenção.
            Após 6 anos, deu-se a ratificação da Convenção através do Decreto n.º 13/93, de 13 de Abril, mas apenas em 2001 se tornou aplicável no território nacional a referida Convenção.
            No seguimento do Programa Nacional de Luta e Vigilância Epidemiológica da Raiva Animal, e promulgado o Decreto-Lei n.º 91/2001, de 23 de Março, que mais não faz do que apenas actualizar os valores das coimas, esquecendo-se de fazer a cópia integral do decreto-lei anterior que revoga e deixando sem solução legislativa entre outros exemplos, a captura e manutenção de animais vadios pelas câmaras municipais, a responsabilidade das despesas no canil municipal, o número de cães permitidos em cada fogo. Estas situações foram  acauteladas em 15 de Dezembro de 2001, com a Portaria n.º 1427.
            A protecção legislativa dos animais ganha corpo com a Lei n.º 92/95, de 12 de Setembro, ainda antes da aprovação do Decreto-Lei n.º 276/2001, de 17 de Outubro, que estabelece medidas complementares de aplicação da Convenção Europeia para a Protecção dos Animais de Companhia, com o respectivo sumário “Protecção aos animais”.

III. A proposta de Lei do Partido Socialista para alteração do estatuto jurídico do animal

            Projecto de lei n.º 173/XII/1.ª

            O reconhecimento da natureza própria dos animais enquanto seres sensíveis e a necessidade de medidas vocacionadas para a sua protecção e salvaguarda face a actos de violência infligidos pelos Homem tem vindo a recolher um consenso cada vez mais forte e alargado nas sociedades contemporâneas.
            Actualmente os animais, no plano jurídico-civil, são submetidos ao mesmo tratamento das coisas. As vozes discordantes e o debate público tem sido cada vez mais recorrente, mobilizando actualmente um consenso cada vez mais alargado no plano filosófico, cultural e jurídico.
            A nível filosófico, há um consenso relativo às responsabilidades dos humanos face às demais espécies capazes de sentir dor. Peter Singer vai mesmo ao ponto de apontar no sentido da consagração de direitos dos animais, mesmo tendo em conta “óbvias e importantes diferenças entre os humanos e os outros animais, devendo estas diferenças dar origem a diferentes consagrações jurídicas”.
            Ao nível do direito comparado, refere-se a Alemanha, que desde 1997, o parágrafo 90.º-A do Código Civil (BGB) afirma expressamente a distinta natureza jurídica dos animais não-humanos face às coisas, determinando a sua regulação em legislação especial, com recurso subsidiário à legislação relativa às coisas.
            Na Aústria, o parágrafo 285.º-A do respectivo Código Civil (ABGB), que afasta a natureza de coisas móveis e remetendo apenas subsidiariamente para o enquadramento das coisas.
            Na Suiça, o artigo 80.º da Constituição de 1999, consagra especial protecção aos animais, acompanhando o respectivo Código Civil, que afirma no seu artigo 641.º que os animais não são coisas.
            Ao nível do Direito da União Europeia, o protocolo n.º 31 do Tratado de Amesterdão indica a necessidade de ponderar o bem-estar animal. O Tratado de Lisboa, desde 2007, no artigo 13.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE), indica que a concepção de políticas da União deve ponderar as exigências em matéria de bem-estar dos animais enquanto seres sencientes.
            Sendo assim, entendem que os animais não devem ser reconduzidos integralmente ao estatuto jurídico das coisas, salvaguardando-se os casos de aplicação subsidiária por ausência de legislação especial de protecção, modificando em conformidade com outras disposições do Código Civil e alguma da sua arrumação sistemática.

            As alterações


Artigo 202.º-A
(Animais)
1 – Os animais podem ser objeto de relações jurídicas, e a proteção jurídica decorrente da sua natureza opera por via de lei especial.

2 – Aos animais são aplicadas as disposições relativas às coisas apenas quando lei especial não seja aplicável e apenas na medida em que não sejam incompatíveis com o espírito dela.


            Dentro das várias alterações que a proposta previa, o novo artigo 202.º-A seria aquele que introduziria um novo estatuto para o animal, um estatuto intermédio à pessoa e às coisas.
            Ao analisar atentamente as várias alterações e tendo em conta o n.º 2 do artigo, parece ainda assim ser discutível a recondução ao regime das coisas, ficando no ar a questão de saber se está realmente a existir uma dissociação entre os dois regimes – da coisa e do animal. Numa análise mais radicalista, não parece ser suficiente.
            A conclusão que igualmente se retira da análise é a visão utilitarista do animal.
            Em causa não está igualmente uma perspectiva ecocêntrica, em que há uma tutela do ambiente em si mesma, procurando-se a defesa e promoção da natureza como um valor novo. Também não se verifica uma perspectiva unicamente antropocêntrica, verificando-se assim uma perspectiva intermédia entre as duas perspectivas anteriormente referidas.

IV. O animal

            O animal é um ser organizado, dotado de sensibilidade e de movimento voluntário. Aqui integra-se o homem também.
            No entanto, a razão é um atributo que separa uns dos outros, constituindo a sua falta o motivo porque aqueles não são capazes de direitos e obrigações, dado que lhes falta a noção do bem, do justo e do conveniente, não lhes podem ser impostos os preceitos da lei, para que seja por eles obedecida e observada. Não podem delinquir nem ser castigados e a responsabilidade pelos danos que ocasionem recai sobre os seus donos. Falta-lhes a inteligência e a liberdade, visto que se movem por força irresistível.
            Nem sempre foi e é tida em conta esta irracionalidade, chegando a atribuir-se aos animais responsabilidade pelo actos por eles praticados, com julgamentos e condenações.
            Mas se a falta de razão inibe os animais de serem sujeitos de direitos, a sensibilidade torna-os merecedores de tutela jurídica, a qual, embora por vezes apenas de modo reflexo se lhes dirija (v.g., o artigo 16.º da Lei de Bases do Ambiente), também os tem como destinatários directos (v.g., a Convenção Europeia para a Protecção dos Animais de Companhia).
            O animal é um ser que sofre, sente alegria e tristeza, fica nervoso, cria relações de amizade e inimizade, brinca e gosta de ser acariciado. Tem até por vezes um grande sentimento de gratidão, como um cão vadio que foi recolhido.
            Todos estes atributos não podem deixar-nos indiferentes quanto à necessidade da protecção legal dos animais, sob pena de uma enorme insensibilidade humana e têm suscitado acaloradas discussões.

V. A relação homem-animal

            São comummente aceites três estágios desta relação, dividos ao longo da história da humanidade.
a) Período mágico e religioso, desde a época Neanderthal (250 000 a.C.)

            Neste primeiro período, o homem tinha um contacto espontâneo, instintivo, com a natureza, semelhante às sociedades animais. Movido pelo instinto e pela experiência, o homem foi tentado a dominar a natureza, introduzindo profundas alterações ao seu habitat.
            O homem foi também obrigado a tornar-se produtivo, a completar as colheitas e a caça com a cultura de plantas selecionadas e com a criação de animais domesticados.

b) Período filosófico, a partir de 1500 a.C.
           
            Com este pensamento filosófico, o homem separa-se da natureza e corta os laços de simbiose que o ligavam a ela. Torna-se independente e começa a explorá-la, a servir-se dela, em função das mutações na maneira de viver, com a formação de modelos de economia moderna.
            Desaparecendo uma coexistência nos limites do razoável e do necessário, o homem criou perturbações graves no equilíbrio ecológico que levam a uma de duas hipóteses: ou prossegue um desenvolvimento descontrolado, com efeitos gravíssimos de devastação do ambiente, com prejuízos para o próprio Homem; ou segue uma prática de conciliação do desenvolvimento económico com a conservação da natureza. O Homem, torna-se assim, o carrasco e a vítima.
            A sociedade ocidental, com uma visão antropomórfica do animal, vê o mesmo como uma máquina, tratando-o sobre um aspecto exclusivo da sua produtividade.

c) Período científico, após o século XVI

            Nos séculos XIX e XX, o pensamento ocidental sofreu uma mudança no sentido do reconhecimento do respeito do animal, de que foram percursores S. Francisco de Assis, Montaigne, Jeremy Bentham e Schopenhauer.
            Desenvolveram-se movimentos favoráveis aos animais e surgiram as primeiras sociedades para protecção dos animais.
            Em parte, estas mudanças devem-se ao progresso das ciências.
            Este respeito e reconhecimento tornou-se mais forte após a 2ª Guerra Mundial.
            Em Portugal, ainda assim, coloca-se um outro problema: o do incumprimento da lei. E é nesse combate que nos devemos focar. Daí ser necessária uma intervenção efectiva no estatuto do animal no nosso sistema jurídico.

            A preservação das espécies representa não só uma necessidade do homem, mas também um acto de justiça. Os animais contribuem para o equilíbrio económico, fazem companhia, servem de guias, salvam pessoas, guardam casas, fazem de jardineiros, ajudam na caça, fazem a guerra que o Homem lhe impõe, servem nas comunicações e espionagem, entre outras utilidades.
            Os animais são utilizados até à exaustão e isso leva até à extinção de algumas espécies, problema que não é de agora. Na era das grandes descobertas e da colonização do planeta a natureza ressentiu-se imediatamente em todas as zonas onde se fez sentir a acção humana. A fauna e a flora selvagens encontram-se em regressão em todo o mundo. Mais de 280 espécies de mamíferos, 350 de aves e 20 000 plantas se extinguiram.
            Há portanto uma necessidade urgente de melhorar a relação homem-animal. É justo e constituirá o cumprimento, por banda do homem, das suas obrigações para com aqueles que satisfazem as suas.

VI. Redefinição do Princípio da Igualdade

            Peter Singer analisa as implicações do princípio moral da igualdade. Certas posições podem ser possíveis de serem defendidas, sem colocar em risco a posição intelectual ou sócia do indivíduo.
            Singer faz convergir o princípio para os não humanos, tendo como questão fundamental a do estabelecimento de um critério que possa servir ao mesmo tempo de princípio e fundamento da ideia que somos todos iguais.
            É então criado o PICIS (Princípio da Igual Consideração de Interesses Semelhantes).
            Desvincula-se o princípio da igualdade de uma assertiva factual, pois tal princípio “não se baseia na posse de inteligência, de personalidade moral, de racionalidade ou de outros dados semelhantes”, pois as diferenças de capacidades não justificam diferenciar a consideração que deve ser dada aos interesses dos seres.
            Singer não quer com o PICIS trazer a ideia de que, para existir igualdade, deve haver tratamento igual ou idêntico, mas sim requerer igual consideração para com os diferentes, que por consequência pode conduzir a tratamento diferente e a direitos diferentes.
            Partilha então a visão utilitarista de Bentham, em que “a capacidade de sofrimento como característica vital que concede a um ser o direito a uma consideração” até porque não são todos os Homo Sapiens que apresentam indícios de características como racionalidade e linguagem e nem por isso são os mesmos excluídos do âmbito da consideração moral.
            Através do PICIS, tem-se que levar em conta o interesse de todos aqueles que serão afectados pelas decisões tomadas e os animais, por serem seres sensitivos, obrigatoriamente devem ter os seus interesses levados em consideração quando forem expostos ao sofrimento ou alegria.
            Ressalta ainda Singer que o que está em jogo não é a precisão na comparação do sofrimento entre membros de diferentes espécies, até porque “não existem boas razões, científicas ou filosóficas, para se negar que os animais sentem dor. Se não duvidarmos de que outros humanos sentem dor, não deveríamos duvidar de que também outros animais sentem”.
            Em conclusão, Singer procura estabelecer um princípio que fundamente a ideia de igualdade, sem discriminar humanos e não-humanos, sendo que, para tal, formulou a PICIS.

1.     O Especismo
                       
                        Baseia-se na diferença entre espécies, porém de uma forma preconceituosa, pois visa minimizar os interesses dos animais não humanos. É um preconceito ou uma atitude pré-concebida favorável aos interesses da própria espécie e desfavorável para os membros das outras espécies.
                        Também aqui o PICIS se torna uma forma de combater o problema.


VII. Conclusão

            A reforma do conceito de animal e a sua posição no ordenamento jurídico é imposta a partir do exterior, a partir da sedimentação costumeira de uma nova prespectiva axiológica, mesmo que difusa e inorgânica.
            Terá que ser a sociedade, com novos hábitos e convicções, a impor ao Direito o reconhecimento de que há alguns seres não-humanos que não só têm interesses que não podem ser objecto de comércio, que não podem ser postos em causa ou alienados a troco de quaisquer benefícios, por mais elevados que esses benefícios  sejam,  mas também têm capacidades de satisfação e sofrimento que, no seio da experiência terrena, são directamente comensuráveis com os da espécie humana, disputando legitimamente com ela os meios escassos com os quais todas as formas de vida dotadas de sensibilidade aumentam a satisfação e reduzem  o sofrimento.
            Há que transcender o radicalismo antropocêntrico, através do descentramento da bioética.
            Defender o descentramento não é sustentar um qualquer recentramento noutras espécies, nem pode servir para recobrir uma simples misantropia.
            Não é, no entanto, menos certo que o respeito ético e jurídico pelos interesses dos animais tem ganho foros de irreversibilidade em muitos meios sociais e culturais, tornando-se hoje praticamente impensável que um filósofo moral formule um apelo genérico à subalternização ou à instrumentalização pura e simples de todos os interesses dos animais, ou defenda um ética antropocêntrica, escamoteando completamente a consideração dos “direitos” dos animais.
            Proteger um animal não quer dizer colocar em paridade os direitos humanos com os dos não humanos, ou defender que um animal não será sacrificado no caso de conflito directo com um interesse humano, mas sim, respeitar na medida do possível, o limite da necessidade, quando um animal tiver que morrer ou sofrer.
            A sensibilidade animal é um argumento mais que suficiente para que não haja, por parte dos humanos, uma procura económica sem ter em conta a dor e o sofrimento animal. O que não quer dizer que os não humanos não possam continuar a compartilhar com o progresso cultural e económico humano.
            O desrespeito animal é sobretudo anti-ético quando um ser humano, mesmo que no exercício do seu direito  de propriedade, exceder os limites impostos pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito.
            Devemos, no entanto, ter em atenção o instinto natural de protecção da espécie. Entre uma vida humana e não humana, a primeira vida tem total prioridade na decisão humana.
            Tendo em conta tudo acima referido e o actual sistema legal português relativo ao estatuto jurídico do animal, parece urgente a sua alteração, com as adaptações necessárias às propostas até hoje apresentadas à Assembleia da República. A defesa dos animais, apesar de consagrada através da defesa do próprio ambiente, deve ver a sua importância elevada a um outro nível.

VIII. Bibliografia

1.     International Enviromental Law, Second Edition, Alexander Kiss and Dinah Shelton, New York, 2000;
2.     Introdução ao Direito do Ambiente, Cláudia Maria Cruz Santos, José Eduardo de Oliveira Figueiredo Dias, Maria Alexandra de Sousa Aragão, Universidade Aberta, 1998;
3.     A Hora dos Direitos dos Animais, Fernando Araújo, Almedina, 2003;
4.     Dos Animais (O Direito e os Direitos), António Pereira da Costa, Coimbra Editora, 1998;
5.     Estudos em Homenagem ao Conselheiro José Manuel Cardoso da Costa, “A Protecção dos Direitos dos Animais”, Sílvia de Mira da Costa Ramos, Coimbra Editora, 2003;
6.     O Contínuo entre Espécies (“Os Direitos dos Animais”), Pedro Pereira Teodoro – relatório apresentado à FDUL para conclusão do Mestrado na Área de Ciência Política, Lisboa, 2007;
7.     Verde Cor de Direito – Lições de Direito do Ambiente, Vasco Pereira da Silva, Almedina, 2005;
8.     Introdução ao Direito do Ambiente, Carla Amado Gomes, AAFDL, 2012;

Ângela Maciel, n.º 19511

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