domingo, 19 de maio de 2013

AIA - TÚNEL DO MARQUÊS DE POMBAL


Na busca de um exemplar de acórdão adequado para postar no presente blog, eis que me surgiu não um, mas três acórdãos, sobre um dos casos mais mediáticos de sempre, a nível ambiental, ocorrido no nosso país.

Trata-se do caso relativo à construção do Túnel do Marquês de Pombal, se bem que me vou cingir apenas ao Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 24 do Novembro de 2004, e materialmente à problemática da imposição ou não de Avaliação de Impacto Ambiental, pois quem tiver a curiosidade de ir ler os acórdãos, facilmente percebe que inúmeras outras matérias poderiam ser abordadas, pelo que aconselho a leitura de todos os acórdãos até para se perceber a matéria em causa, sob pena de uma explicação ainda que resumida ir tornar este post muito monótono, muito extenso e pouco objectivo. 

O presente caso teve como primeira decisão o Acórdão do 2.º Juízo do Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa, de 22 de Abril de 2004, Processo nº 11/04-A, que de forma resumida, na referida decisão, relativamente à temática da alegada falta de Avaliação de Impacto Ambiental é efectuada uma breve enunciação do quadro legal, sobretudo comunitário, sendo ainda as normas interpretadas sob o princípio da precaução, onde é notória e evidente uma defesa do ambiente, na esteira do princípio “in dúbio pro ambiente”, foi decidido, um pouco em contradição com a ratio que foi dada durante a fundamentação às normas legais, que a obra não estava sujeita a Avaliação de Impacto Ambiental.

Em segunda instância, surge o Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul, de 14 de Setembro de 2004, Processo nº 251/04, vindo referir que não se sustenta a tese enunciada no acórdão da 1ª instância, concluindo e decidindo assim que a obra na altura em crise, necessitava de Avaliação de Impacto Ambiental.

Por fim, resta-me indicar e fazer um comentário mais alargado sobre o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 24 de Novembro de 2004, Processo nº 1011/04.

Entendeu o tribunal superior relativamente à questão da necessidade ou não de Avaliação de Impacto Ambiental, que “assiste razão ao recorrente enfermando o acórdão do TCA Sul de erro de julgamento” (1)
 especificando a decisão “ pelo apelo que é feito no acórdão recorrido à alegada existência de previsão normativa expressa, que legitimaria o recrutamento das providências cautelares, na medida em que a situação dos autos se subsumiria na hipótese prevista no ponto 10, 1ª parte alínea h), do anexo II ao DL nº 69/2000, que obrigaria a AIA, temos para nós que é patente o erro de julgamento de que enferma o questionado acórdão” (2).

De facto, é obvio que a obra em causa, ou seja, a construção do assim denominado «Tunel do Marquês» se não insere, clara e manifestamente, na previsão da dita alínea h).

É de fácil conclusão e concordo com o disposto que a presente situação não é abrangida pela alínea h) da referida disposição legal, porém, recorde-se que o regime legal da AIA não é fechado pois, embora o nº2 do art. 1º tenha carácter taxativo, por sua vez, do nº3, do art.1 do DL 69/2000, resulta que fora das situações tipificadas nos Anexos I e II, poderá ser determinada a obrigatoriedade de realização de AIA, mas por via de decisão administrativa.

Existe assim duas vertentes para sujeição a AIA, uma “fechada”, com suporte no texto da lei, e uma “aberta”, tendo em conta o caso em concreto, pois como bem se sabe o Direito do Ambiente e as questões a si inerentes são talvez dos pontos mais sensíveis no Direito, devido à influência directa que qualquer decisão ou acto pode ter na vida e no dia-a-dia do ser Humano.

É neste sentido que discordo totalmente da decisão do STA, pois não atendeu claramente à perspectiva da discricionariedade presente no art. 1º, nº3 do DL 69/2000, sendo inadmissível como uma obra com esta dimensão, no centro da capital do nosso país, em que afecta não só os cidadão residentes na área circundante, como os milhares que diariamente passam no local, não esteja sujeita a AIA, podendo assim claramente prejudicar a qualidade de vida de um número consideravelmente elevado de cidadãos.

Foi ainda abordado pelo douto acórdão, que ora se analisa, por força do alegado pelo recorrido, a questão da aplicabilidade directa do art. 30.º da Lei de Bases do Ambiente, ao projecto em causa. Porém, tal preceito apenas prevê de forma genérica a realização de estudo de impacto ambiental, relativamente a planos, projectos, trabalhos e acções que possam afectar o ambiente, os quais são determinados, em concreto, por aplicação de normas legais densificadoras.
Ora, torna-se claro que uma qualquer defesa da tese que o projecto na altura em crise deveria estar sujeito a AIA não poderia basear-se apenas nesta norma, pois carece de densificação e normativização que a mesma impõe, podendo apenas ser alegada como um princípio da tese a defender-se e não como justificação dessa mesma tese, porém, cumpre realçar que não deixa de ser uma norma da Lei de Bases, sendo que toda a actuação se deve cingir sob esse princípio, claro está, com a devida densificação na lei.

É um facto que facilmente se pode consultar através de dados estatísticos que cada vez menos projectos ou obras estão a ser sujeitos a AIA, porém não custa recordar que se está a falar no centro de uma cidade mundialmente histórica e que por sinal é a capital do nosso país, podendo independentemente de tais factos, trazer graves problemas ambientais, pois estamos a falar de um túnel, em que o subsolo é percorrido por vários rios subterrâneos, sendo rico nos mais diversos minerais, recordando que após o terramoto de 1755, a cidade foi totalmente reconstruída, em certas situações por cima de antigas edificações e túneis naturais.

Como conclusão, defendo a tese de que atendendo à falta de disposições normativas que possam ser usadas para defender, que a obra do «Túnel do Marquês» se encontra directamente sujeita a AIA. Concluo que devido à enorme dimensão da obra, ao local onde se encontra afecta, aos cidadãos que são abrangidos e afectados pela obra e à própria possível afectação do meio ambiente, considero que com a discricionariedade que a lei permite e foi supra descrita, não poderia ser outra a conclusão de que o Acórdão do STA devia impor AIA, sob pena de afectar gravemente o ambiente e a qualidade de vida do cidadãos inerentes a uma obra com tal dimensão.

(1),(2) - Pedro Portugal Gaspar, “Acórdãos relativos à construção do túnel do Marquês de Pombal : problemática da avaliação de impacte ambiental"


Ana Catarina Domingos
nº 20386







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